IR sobre Ganhos de Capital – Parte IV

 Para encerrar a série a respeito das hipóteses de isenção do IR sobre ganhos de capital auferidos nas alienações de bens e direitos, cuidaremos, nesta oportunidade, do espólio como contribuinte e como sujeito de direito às isenções de que trata a legislação tributária federal.

Com fulcro no que dispõe a legislação em vigor, as transmissões de bens e direitos em decorrência da morte da pessoa proprietária podem dar ensejo à incidência do IR sobre Ganhos de Capital – IRGCap –, caso sejam transmitidos aos seus sucessores por valor de mercado, via de consequência, por valor superior ao que consta na declaração de bens do “de cujus”.

Ocorrido o fato gerador do IR, vale marcar que da redação dada ao art. 11 do Regulamento do Imposto de Renda – RIR/99 – aprovado pelo Decreto nº 3.000/99, pode-se depreender que, para os fins tributários, a pessoa física do contribuinte não se extingue imediatamente após a sua morte, prolongando-se, por meio do seu espólio, até que realizado o inventário seja entregue a respectiva Declaração Final de Espólio.

Com efeito, o espólio é o sujeito passivo do imposto incidente sobre o ganho de capital, porventura, auferido na transmissão “causa mortis” de bens e direitos e os procedimentos relativos ao cumprimento dessa obrigação tributária (apuração e recolhimento) são entregues ao inventariante, por ser ele o administrador do acervo hereditário.

Assim, cumpre ao espólio do falecido, por meio da pessoa nomeada inventariante, a observância das obrigações tributárias decorrentes dos atos e fatos ocorridos até a sua extinção, que se dá com o inventário e partilha, ou adjudicação, dos bens e direitos deixados pelo “de cujus”.

Se o bem for recebido pelo herdeiro pelo valor que constava na declaração do autor da herança, não haverá diferença positiva entre o valor pelo qual o bem é transmitido e aquele considerado como custo de aquisição, de tal sorte que não estará configurado o ganho de capital.

Mas se o bem for recebido pelo herdeiro por seu valor de mercado e este sendo – como sempre é -, maior do que o constante na declaração do “de cujus”, incidirá sobre a diferença positiva entre eles a alíquota do imposto (15%), salvo se puder ser aplicada ao caso alguma das hipóteses de isenção.

Noutras palavras: se, de um lado, o espólio é sujeito de obrigações, de outro, é ele detentor das mesmas prerrogativas que tem o contribuinte vivo. Nesse passo, ao espólio também é dado o direito de fruir as hipóteses de isenção a que fazem jus as pessoas físicas contribuintes do IRGCap. Ou seja, se na transmissão “causa mortis”, caracterizado o ganho de capital, incide o imposto de competência da União, nada mais justo e adequado que no procedimento previsto para a sua apuração sejam consideradas as exclusões do crédito tributário e as reduções da base de cálculo, quando, evidentemente, forem preenchidos os requisitos trazidos pela legislação em vigor para a sua fruição.

Nesse exato sentido, manifesta-se o Fisco Federal por meio do suplemento intitulado “Perguntas e Respostas – IRPF 2014” (questões nºs 605 e 606), verbis:

ALIENAÇÕES DIVERSAS — APLICABILIDADE DA ISENÇÃO.

605 — Para as alienações decorrentes de adiantamento da legítima, dissolução da sociedade conjugal ou união estável esucessão causa mortis, aplicam-se as isenções do bem de pequeno valor, do único imóvel e dos bens adquiridos até 1988?

SimTais transferências também são beneficiadas com essas isenções, desde que satisfaçam as exigências legais (Original sem destaques).

ALIENAÇÕES DIVERSAS — APLICABILIDADE DE REDUÇÃO.

606 — Para as alienações decorrentes de adiantamento da legítima, dissolução da sociedade conjugal ou união estável e sucessão causa mortis, aplicam-se os fatores de redução de que trata a Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005?

SimTais transferências também são beneficiadas com essas isenções* (sic), desde que satisfaçam às exigências legais.” (Original sem destaques).

*constatamos que a Receita Federal do Brasil, inadvertidamente, usa o vocábulo “isenções” em lugar de “reduções”, o que, no contexto, não prejudica o sentido da mensagem, que é o de concordar com a aplicação das reduções da base de cálculo do tributo nas transmissões “causa mortis”, quando o caso.

De todo o exposto, podemos concluir que:

a) O IRGCap incidirá sobre a diferença positiva entre o valor de mercado e o constante na declaração do “de cujus”, nas sucessões “causa mortis”;

b) Ainda que o bem seja recebido pelos sucessores por valor superior ao que constava na declaração de bens do autor da herança, pode o espólio ficar isento do pagamento do tributo desde que preenchidos os requisitos legais (Bens de pequeno valor, alienação do único imóvel);

c) Ainda que o bem seja recebido pelos sucessores por valor superior ao que constava na declaração de bens do autor da herança, são aplicáveis os fatores de redução da base de cálculo do tributo, também desde que preenchidos os requisitos legais (vide IN-SRF nº 599/05); e

d) O sujeito passivo do imposto incidente sobre os ganhos auferidos com a transmissão “causa mortis” é o espólio, ainda que as responsabilidades pela apuração e recolhimento sejam atribuídas ao inventariante.

Nota da Redação INR (1): o leitor pode ter acesso, clicando aqui, ao que pensa o autor sobre a isenção do imposto na alienação de bens de pequeno valor, tema sobre o qual versou a primeira parte da série IR sobre Ganhos de Capital na Alienação de Bens e Direitos – Hipóteses de Isenção.

Nota da Redação INR (2): o leitor pode ter acesso, clicando aqui, ao que pensa o autor sobre a isenção do imposto na alienação do único imóvel no valor de até R$ 440.000,00, tema sobre o qual versou a segunda parte da série IR sobre Ganhos de Capital na Alienação de Bens e Direitos – Hipóteses de Isenção.

Nota da Redação INR (3): o leitor pode ter acesso, clicando aqui, ao que pensa o autor sobre a regra de isenção do imposto sobre o ganho de capital auferido na alienação de imóvel residencial se o alienante, com o dinheiro da venda, adquirir outro imóvel residencial, tema sobre o qual versou a terceira parte da série IR sobre Ganhos de Capital na Alienação de Bens e Direitos – Hipóteses de Isenção.

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EXIBINDO 0 COMENTÁRIOS

  1. Márcia disse:

    Parabéns pelo artigo! Notável e altamente esclarecedor.

  2. Antonio Herance Filho disse:

    Muito obrigado, Márcia!
    Você é muito gentil e generosa.
    Fraternal abraço.

  3. AleXANDRE disse:

    Aproveito o espaço para sugerir um tema para um próximo artigo: Súmula 377 +separação obrigatória+ esforço comum +testamento, tema este, que causa grande dúvida no meio jurídico e a mim particularmente enorme tormento. Seu parecer seria de grande valia.

    Grato.

  4. Antohio Herance Filho disse:

    Olá Alexandre,
    Os temas que você sugere são ótimos e ricos em controvérsias, mas não estão na área de minha atuação (tributária).
    Peço-lhe que reencaminhe o seu pedido aos colunistas da área, por favor.
    Fraternal abraço.

  5. cristina disse:

    Boa Noite dr,
    Peço a gentileza de um esclarecimento…é possível que os herdeiros recebam a herança pelo valor do último IR do “de cujus” ainda que na escritura de inventário tenha constado os valores venais – p fins de ITCMD (valores maiores que os declarados pelo falecido)? Normalmente atribuo o valor venal para fins de imposto estadual e faço constar que os herdeiros por sua vez atribuem aos bens o valor do último IR do inventariado. Ocorre que no caso em comento, só ficou constando o valor venal na escritura de partilha, ainda assim é possível valer-se da faculdade de lançar na declaração final do espólio o valor de IR?? e consequentemente o mesmo nas declarações dos herdeiros? ou a RF considerará o valor venal como sendo o de transmissão? Entendo que o que vale é o que consta na declaração do espólio estou errada??

  6. cristina disse:

    CONTINUANDO…pelo que entendi da leitura da legislação tributária o valor atribuído aos bens para fins de IR é uma opção conferida à inventariante, ou seja, ela pode ou não valorar os bens, é uma escolha (a partilha seria uma oportunidade de atualizar o valor dos bens, do contrário eles devem ser lançados de acordo com o último IR…já que não se pode atualizar o preço dos mesmos de acordo com o mercado, salvo reformas, etc ). Estou certa???
    Esta questão é para mim de alta indagação, agradeço muitíssimo o seu parecer.
    GRATA.

  7. Antohio Herance Filho disse:

    Olá Cristina,
    Antes de tudo, peço-lhe que me desculpe pela demora da resposta.
    Quanto ao IR, com fulcro nos dispositivos do art. 20, da IN-SRF nº 84/2001, não há dúvidas; o espólio será sujeito passivo da obrigação tributária principal (recolhimento do IR sobre Ganhos de Capital), a depender da opção a ser feita pelos sucessores do autor da herança.
    Não importam os valores que constam na escritura para os demais fins (partilha, para pagamento dos quinhões hereditários e, se o caso, da meação, Cálculo e recoclhimento do imposto “causa mortis”, Cobrança de Emolumentos, Informação na DOI), o que vale é a comunicação entre as declarações (Final de Espólio e dos sucessores) e o valor que delas constar em razão da opção eleita (valor que constava na declaração do “de cujus” OU valor de mercado do bem).
    Quanto ao imposto “causa mortis”, o que você vem fazendo, como afirmou, não posso dizer se concordo porque não sei de que Estado você é. No Estado de São Paulo, por exemplo, a base de cálculo do tributo é o VALOR DE MERCADO do bem, o que não se confunde com o valor utilizado pelo Município de situação do imóvel para o lançamento do IPTU.
    É isso.
    Obrigado pela oportunidade do contato.
    Herance

  8. Cristina disse:

    Mais uma vez sem palavras para agradecer seu parecer altamente esclarecedor! Muito Obrigada pelo dispêndio de tempo em atender-me, o que faz certamente é uma caridade.
    Estou em SP, e até então usávamos a lei A Lei Estadual 10705/00 com alterações da lei 10.992/2001, que dispõe no seu artigo 9º:
    A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).
    § 1º – Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.
    Não sei se algo mudou….pois há um bom tempo não tenho feito partilhas….sei q tb há algum tempo atrás na cidade de SP usávamos o valor venal de referência (que normalmente é bem maior que o valor venal dos outros municípios, valor este bastante questionável do ponto de vista constitucional).
    Por favor não considere minha resposta uma afirmação, pois, estou desatualizada e tb não sou especialista no assunto (é uma nova dúvida).
    Um grande abraço e muito obrigada pela atenção sempre.

  9. Cristina disse:

    Desculpe, ficou faltando parte da referida lei acima mencionada:
    Artigo 13 – No caso de imóvel, o valor da base de cálculo não será inferior:
    I – em se tratando de imóvel urbano ou direito a ele relativo, ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU;
    II – em se tratando de imóvel rural ou direito a ele relativo, ao valor total do imóvel declarado pelo contribuinte para efeito de lançamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR.

  10. Marcelo disse:

    Olá, Sr. Antonio Herance.

    Primeiramente, parabéns pelo artigo!

    Gostaria que, se possível, o senhor tirasse uma dúvida quanto a essa questão da opção dos herdeiros pelo valor da última declaração ou valor de mercado.

    O artigo 10, § 3°, da Instrução Normativa n° 81 da SRF determina que “A opção por qualquer dos critérios de avaliação a que se refere este artigo deve ser informada na Declaração Final de Espólio, sendo vedada a sua retificação”.

    Se na escritura pública de inventário consta que os herdeiros atribuíram aos bens o valor de mercado, seria possível fazer uma retificação dessa escritura para que se altere para o valores que constam na última declaração do “de cujus”? Pelo que eu entendo desse dispositivo, a vedação à retificação aplica-se apenas à Declaração Final, e não à escritura pública. Enquanto não for feita a Declaração Final, a retificação da escritura seria permitida.

    Minha dúvida surgiu porque conversei com uma pessoa que trabalha em cartório que disse que eles comunicam à Receita Federal os valores atribuídos aos bens a cada escritura de inventário que é feita.

    Muito obrigado,
    Marcelo.

  11. Vladimir M. Moreira disse:

    Caro, Antônio Herance.

    Em 2014 . Os meus país possuíam um imóvel cujo valor de mercado é R$ 1.000.000,00. Com o falecimento da minha mãe herdamos ( 04 filhos) 50% Deste imóvel. Pagamos 4% de imposto estadual sobre o valor de R$ 500.000,00
    O imóvel foi adquirido pelos meus país em 1984 por CR$ 36.000.000,00 (cruzeiros). Na declaração do IR do meu pai de 2013/14 ele constava com o valor de R$ 600.000,00.
    Pergunto:
    – teremos que pagar imposto sobre Ganho de Capital?
    – em que momento teremos que pagar esse imposto..?
    – o cálculo será efetuado com base em quais valores?

  12. Antonio H. Filho disse:

    Prezado Vladimir, bom dia!

    Na ordem de suas indagações, manifesto-me, objetivamente, nos seguintes termos:

    – teremos que pagar imposto sobre Ganho de Capital?
    1) Se os herdeiros receberem, cada qual a sua cota parte, pelo valor que constava na declaração do falecido pai (R$ 75.000,00), não haverá incidência tributária;
    2) Se os herdeiros receberem, cada qual a sua cota parte, pelo valor de mercado (R$ 125.000,00), o imposto incidirá sobre o ganho de capital (diferença positiva entre o valor da transmissão (R$ 500.000,00) e o constante na declaração do “de cujus” (R$ 300.000,00).

    – em que momento teremos que pagar esse imposto?
    O imposto deverá ser pago até o final do prazo de entrega da Declaração Final de Espólio (depende de quando foi feito o inventário, se é que já foi feito ou concluído).

    – o cálculo será efetuado com base em quais valores?
    Admitindo a hipótese 2) da resposta à primeira indagação, a diferença positiva entre o valor de transmissão e o valor da declaração do falecido, que resulta em R$ 200.000,00, poderá ser reduzida em 25% em razão da data de aquisição do imóvel.

    Atenciosamente,
    Herance

  13. Paulo Rafael Fenelon Abrão disse:

    Ilegalidade na cobrança de Imposto de Renda (ganho de Capital) na doação e transferência de bens em inventário

    A cobrança de Imposto de Renda sobre o ganho de capital na transferência de bens a valor de mercado ocorrida na doação e na transmissão de bens aos herdeiros quando do falecimento do autor da herança foi declarada inconstitucional.

    Ocorre que o §1º, do artigo 23, da Lei 9.532/97 dispõe que: se a transferência for efetuada a valor de mercado, a diferença a maior entre esse e o valor pelo qual constavam da declaração de bens do de cujus ou do doador sujeitar-se-á à incidência de imposto de renda à alíquota de quinze por cento. Já o caput do artigo 23, faculta que a doação e a herança podem ser realizadas com o mesmo valor constante da declaração de renda do de cujus ou do doador ou ainda a valor de mercado. Sendo que, na declaração a valor de mercado a lei prevê a cobrança do imposto de renda.

    De início poder-se-ia imaginar que então a solução seria sempre realizar a doação e a transferência da herança com o mesmo valor da declaração do autor da herança. Todavia, é preciso que reste claro que neste caso quando os donatários ou herdeiros pretenderem vender o que receberam a este título, havendo diferença a maior, tal diferença será regularmente tributada pelo imposto de renda sobre o ganho de capital; ao passo que, caso a transferência dos bens por herança ou doação tivesse ocorrido a valor de mercado, muito provavelmente não haveria diferença a tributar ou essa diferença certamente seria bem menor quando da efetivação da venda posterior, ou seja, a carga tributária seria muito menor.

    Para maiores esclarecimentos acesse o informativo:

    http://www.fenelonadvogados.adv.br/arquivos/downloads/fenelon-abrao-advogados-ss-informativo-ganho-de-capital-planejamento-tributario-em-inventario-doacao-dissolucao-da-sociedade-conjugal-16371813.pdf

  14. mario disse:

    como declaro as bnefeitorias feitas no imovel, custos de cartorio e registros?

  15. Antonio H. Filho disse:

    Sr. Paulo,

    As decisões judiciais prolatadas até o momento não produzem efeitos “Erga omnes”, de tal sorte que para obter, no caso concreto,”uma” que afaste a incidência do tributo, o que é visto também por nós como muito interessante, a tentativa deve ser feita buscando-se a guarida do Poder Judiciário.

    Com efeito, enquanto a providência acima referida não for implementada, como a hipótese de incidência está positivada (já que os dispositivos da Lei nº 9.532/97 que tratam da matéria seguem em vigor), não há como pensar na transmissão pelo valor de mercado sem que se aplique o Regulamento do Imposto de Renda – RIR/99, aprovado pelo Decreto nº 3.000, de 1999.

    Cordialmente,

    AHF

  16. Antonio H. Filho disse:

    Sr. Mario,

    Quando da aquisição, o bem deve ingressar na declaração de bens do adquirente pelo valor pago adicionado dos demais custos diretos (ITBI, emolumentos notariais, emolumentos registrais etc).

    Relativamente às benfeitorias realizadas no imóvel, o custo destas devem ser somados, no ano calendário em que forem efetivamente pagos, ao que consta na declaração.

    Todos os eventos (pagamentos efetuados), deverão ser comprovados à autoridade fazendária, se forem solicitados. Logo, recibos, guias de recolhimento de tributos, notas de emolumentos e todos os documentos idôneos devem ser mantidos, juntamente com o título aquisitivo do imóvel, à disposição da fiscalização da RFB.

    Atenciosamente,

    AHF

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