A ATIVIDADE DE CONTROLE E A FUNÇÃO NOTARIAL E DE REGISTRO

RESUMO

O artigo apresenta o novo enfoque do controle, elemento de destaque dentre aqueles que constituem a atividade administrativa. Esse novo enfoque é fundamentado nos princípios constitucionais e consiste no controle-consensual, no controle-impulso, orientado no sentido de buscar o melhor resultado da atividade e não apenas detectar falhas para a aplicação de sanções. O controle é importante em qualquer administração, mas, na Administração Pública, ganha ainda maior relevância, sendo essencial ao Estado Democrático de Direito, pois consubstancia uma garantia dos administrados ao evitar falhas, tornando mais eficiente o serviço.  É demonstrado, ainda, como é essencial que esse novo controle seja aplicado também à função notarial e de registro de modo a propiciar que essa importante função pública possa ser desempenhada com cada vez mais qualidade.

1 INTRODUÇÃO

Com o presente artigo é apresentada uma visão da moderna administração no Estado Democrático de Direito, priorizando o novo entendimento sobre a atividade de controle. O controle concilia todos os demais elementos da administração e é essencial em qualquer organização, mas, na Administração Pública, o controle constitui a maior forma de garantia dos administrados. São examinados alguns aspectos do enfoque sobre o controle da função notarial e de registro, que é desempenhada nos popularmente conhecidos como “cartórios extrajudiciais”, sendo demonstrada a necessidade de alteração do foco do controle também para essa função, de modo que ele tenha como objetivo principal o sucesso da atividade e não a aplicação de sanções, em conformidade com os princípios constitucionais, notadamente os princípios da boa-fé e da eficiência.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1 As funções do Estado

Seabra Fagundes ensina que o Estado é criado, ou reconstruído, pelo Poder Constituinte que, por meio da Constituição, “[…] institui a autoridade, delimitando a organização dos poderes públicos, e define os direitos fundamentais do indivíduo.” (FAGUNDES, 1984, p. 15)

Ainda conforme Seabra Fagundes (p. 16-19), o Estado realiza seus fins por meio de três funções: legislativa, que se liga aos fenômenos de formação do direito; administrativa e jurisdicional, que se prendem à fase de realização do direito, sendo ambas funções de execução. A cada função corresponde um Poder (Executivo, Legislativo e Judiciário), cujos órgãos não exercem de modo exclusivo a sua função, mas sim têm nela a sua competência principal ou predominante.

A função administrativa é aquela pela qual o Estado determina as situações jurídicas individuais, concorre para sua formação e pratica atos materiais. Já a função jurisdicional é aquela que restaura a legalidade, pressupondo um conflito em torno da realização do Direito e visando à remoção desse conflito pela definitiva e obrigatória interpretação da lei.

A diferença principal entre a função administrativa e a função jurisdicional está no fato de que a primeira aplica o Direito de forma não definitiva, já que seus atos são passíveis de exame por parte do Poder Judiciário, mediante provocação, e a segunda o aplica de forma definitiva. No entanto, ambas as funções têm como objetivo determinar ou definir situações jurídicas, realizando o Direito pela individualização da lei.

Até muito recentemente, o estudo da atividade de controle da Administração Pública era limitado àquela exercida pelo Poder Judiciário, no curso de processos judiciais. No entanto, o controle exercido pela própria Administração vem ganhando realce, por ter resultados mais rápidos e por resolver de forma menos traumática os problemas do dia a dia, considerando a realidade da prática administrativa e abrindo possibilidade de diálogo entre o controlador e o controlado. (FERRAZ, informação verbal)

2.2 A função administrativa e a atividade de controle

É objeto da função administrativa individualizar a lei, dando a ela efetividade, de modo que sejam alcançadas as diversas situações concretas pretendidas pelo enunciado genérico da lei. (FAGUNDES, 1984, p. 19)

Para melhor estudo da função administrativa, não é suficiente a ciência jurídica, sendo necessário buscar amparo também na ciência da administração, cujo objeto é o fato administrativo, social, que implica relações humanas orientadas para o alcance de certos objetivos desenvolvidos em marco particular, constituído pelas organizações. (FERRAZ, 1999, p. 69)

Considerando a ciência da administração, podemos afirmar que a atividade administrativa sempre tem uma finalidade, subordinada a uma decisão de poder (política). Na seara estatal, a atividade administrativa pressupõe a preexistência de uma regra jurídica, legitimada pelo atendimento ao interesse coletivo, já que todo o poder emana do povo, nos termos do art. 1º da Constituição da República de 1988 – CR/88. Pode-se dizer que “[…] no Estado de Direito as decisões políticas (de poder) são tomadas no exercício de função legislativa e implementadas pelo exercício da função administrativa (de execução da lei) […]”, estando essas decisões sempre submetidas ao atendimento de uma finalidade cogente, qual seja, o interesse público. (FERRAZ, 1999, p.69-70)

Administrar envolve uma série de atividades, destinadas a atingir fins específicos, que consistem, fundamentalmente, em prever, organizar, comandar, coordenar e controlar:

Em substância, administrar é: prever (traçar o programa de ação), organizar (constituir o organismo); comandar (dirigir, direcionar o pessoal); coordenar (harmonizar atos e esforços) e controlar (velar para que tudo corra de acordo com as regras estabelecidas e as ordens dadas). (FERRAZ, 1999, p. 207)

Dentre os elementos da administração, deve ser destacado o controle, que concilia todos os demais elementos, sendo essencial em qualquer organização. O controle, ao detectar falhas, evita sua repetição, aumentando a eficiência do serviço, razão pela qual, na Administração Pública, o controle constitui uma garantia dos administrados, sendo inerente ao Estado de Democrático de Direito. (FERRAZ, 1999, p. 73-76)

2.3 O controle da função notarial e de registro

O titular dos denominados “serviços notariais e de registro”, após aprovação em concurso público de provas e títulos, recebe, por meio de delegação feita pelo Estado, a autoridade para cumprir funções estatais que visam à realização de fins públicos (art. 236 e seus parágrafos, da Constituição da República de 1988), garantindo, conforme art. 1º da Lei de Registros Públicos – Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos. (BRASIL, 2009)

A delegação ao titular é uma forma de descentralização administrativa por colaboração, na qual o exercício de atividades jurídicas e materiais é outorgado a uma pessoa física, profissional do direito, que exerce de forma privada a função pública.  (RIBEIRO, 2008, p. 135)

Apesar de não se tratar de um servidor público, o titular é um agente público, pois atua exercendo poderes do Estado, razão pela qual está sujeito a fiscalização e a controle segundo métodos próprios da Administração Pública (CENEVIVA, 2008, p. 56), fiscalização essa que deverá ser feita pelo Poder Judiciário, nos termos do que determina a Constituição da República, no § 1º do seu art. 236. (BRASIL, 1988)

O fundamento para a fiscalização está em que o Estado, ao delegar a execução direta do serviço público, assume o dever de intervir e garantir que os notários e registradores cumpram adequadamente suas atribuições, satisfazendo o interesse público e as necessidades da coletividade (RIBEIRO, 2008, p. 136). Mas não deve ser somente essa a perspectiva. O Poder Judiciário tem o poder-dever de exercer o controle sobre os serviços notariais e de registro e, como a todo dever opõe-se um direito, o titular dos serviços tem o direito de ser devidamente controlado, de ser orientado sobre a melhor forma de proceder para a instalação do serviço logo em seguida à aprovação no concurso público, de ter o serviço regulamentado e de ter suas dúvidas esclarecidas, principalmente nos casos em que a lei não trate expressamente de determinada situação ou nos casos em que a interpretação da norma legal seja divergente.

O entendimento acima exposto está de acordo com a nova perspectiva sobre o Direito Administrativo, sendo o novo enfoque do controle um dos seus aspectos. Esse novo olhar é fundamentado na Constituição e na teoria do conhecimento, que propõe a interação entre os diversos campos do saber.

 

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Sobre a autora:

Letícia Franco Maculan Assumpção – Graduada em Direito pela UFMG, pós-graduada, mestre e doutoranda em Direito. Oficial do Cartório do Registro Civil e Notas do Distrito de Barreiro, em Belo Horizonte, MG. Diretora do Instituto Nacional de Direito e Cultura – INDIC. Professora e co-coordenadora da Pós-Graduação em Direito Notarial e Registral na parceria INDIC-CEDIN. Vice-Presidente do Colégio Registral de Minas Gerais e Diretora do CNB/MG. Autora dos livros Notas e Registros, Casamento e Divórcio em Cartórios Extrajudiciais do Brasil e Usucapião Extrajudicial, além de diversos artigos na área do direito notarial e registral.

 

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