TESTAMENTO CERRADO DE ANALFABETO

O testamento cerrado é vedado ao analfabeto. A inobservância de lei importa em absoluta nulidade do ato.

Mas há quem defenda o contrário. Na última semana fui procurado por um causídico para lavrar a aprovação de um testamento cerrado, feito por analfabeto, escrito e assinado por uma terceira pessoa, a rogo.

Como justificativa, exibiu doutrina defendendo que o testamento pode ser feito e deve ser aprovado, ainda que assinado por quem o escreveu a rogo, se o testador não souber ou não poder fazê-lo, ficando consignada no instrumento de aprovação a razão por que o não assina.

Argumentei que o art. 1.868, do Código Civil, não admite essa interpretação, dispondo que o testamento cerrado escrito pelo testador, ou por outra pessoa, a seu rogo, e por aquele assinado, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu substituto legal.

Assim, a lei permite que o ato possa ser escrito por outra pessoa, a pedido do testador, se este tiver dificuldade para escrever, ou por outro motivo. Mas é imperioso que o assine, não valendo se não for assinado de próprio punho pelo testador.

Diante da recusa, foi embora indignado, com o cliente à cabresto, mas tornou triunfante no dia seguinte, municiado com a norma administrativa gaúcha (Consolidação Normativa Notarial e Registral – Prov. 32/06-CGJ/RS) que estabelece o seguinte:

"Não podendo o testador assinar, uma das testemunhas, por ele indicada, firmará a seu rogo, declarando fazê-lo por aquele não saber ou não poder assinar" (art. 631, § 6º).

Por evidente que não foi atualizada a consolidação, mantendo entendimento que havia ainda à luz do código anterior.

Desde 2003, com a entrada em vigor do atual código civil, não resta nenhuma possibilidade ao analfabeto a permitir-lhe o testamento cerrado.

O art. 1.872 espanca qualquer dúvida: Não pode dispor de seus bens em testamento cerrado quem não saiba ou não possa ler.

Contraditório? Não. Nenhuma contradição. O que a lei permite é que o testamento cerrado seja escrito a rogo do testador. Assinado a rogo, não.

O analfabeto, portanto, para validade e eficácia de suas disposições de vontade, somente pode fazer testamento público, escrito com exclusividade por um tabelião de notas ou por seu substituto legal.

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  1. Marco A Camargo disse:

    Perfeito, Hildor! Testamento particular é sempre fonte de dúvida e insegurança. De testador analfabeto, pior ainda. A Lei foi sábia em vedar esta possibilidade de testamento cerrado assinado a rogo. O texto do colunista, como de costume, preciso e muito instrutivo. Parabéns ao colega!

  2. J. Hildor disse:

    Marco Antônio, obrigado.
    De fato, o testamento particular, nele incluído o cerrado, é tema tormentoso para deslinde judicial, em grande número de vezes.
    Por isso é sempre aconselhável o testamento público, feito por profissional com conhecimentos bastantes para evitar a nulidade das disposições de última vontade.

  3. Alex disse:

    Dr. Hildor, como vai?
    Mais uma vez recorro aos seus conhecimentos para esclarecer um caso. Um cliente deseja adquirir um imóvel cuja matrícula aponta pertencer a 3 pessoas, sendo 50% de um casal atualmente divorciado ( com 25% para cada) e um terceiro que possui os outros 50%. Ocorre que um dos ex cônjuges teve sua parte penhorada em uma execução fiscal. Pergunto: é possível comprar através de escritura pública a parte deste imóvel q não é objeto de constrição, ou seja, a meação da ex mulher e os outros 50% de um terceiro (75%), deixando para adquirir os 25% penhorados através de hasta pública? ou o bem fica totalmente indisponível embora os 2 outros proprietários nada tenham a ver com a dívida daquele q teve parte de seu bem penhorado? A referida penhora não consta da matrícula do imóvel. Outro ponto, a partilha do divórcio não foi registrada, o bem estando indiviso pode ser separado com a anuência de ambos os ex cônjuges no ato da venda sem que seja necessário registrar a partilha? Os demais proprietários q não possuem pendências estarão agindo legalmente vendendo suas partes?
    Obrigado.

  4. J. Hildor disse:

    Alex, se a matrícula do imóvel não apresenta o registro de penhora, o imóvel está livre, e pode ser alienado no seu todo.
    Antes da venda, deve ser registrada a partilha do casal que se divorciou.

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