Vida de Registrador Imobiliário não é fácil

Vida de Registrador Imobiliário não é fácil

A Justiça do Trabalho manda, o registrador, sob pena de sofrer pesadas sanções, obedece e cumpre a ordem, mesmo sabendo que ela fere os princípios registrários e que deveria ser desqualificada.

O zeloso oficial, após cumprir o mandado e ofender os princípios que norteiam o sistema registrário, comunicou seu corregedor por acreditar que o ato praticado haveria de ser, como tradicionalmente se fazia, desconstituído por nulidade de pleno direito.

No entanto fatos novos forçaram uma mudança de posição de seu  corregedor.

O ato praticado permanecerá produzindo efeitos  até que seja desconstituído, o que se espera seja feito pela própria Justiça do Trabalho, antes da expedição de carta de arrematação.

Ao oficial caberá apenas notificar o titular do domínio afetado pelo ato para que o mesmo possa defender seu direito nas vias ordinárias.

O decidido abaixo transcrito, publicado no Diário da Justiça Eletrônico de São Paulo, no dia 29 de março de 2011, merece ser lido e conhecido por todos, pois indica a fórmula a ser adotada como regra em casos semelhantes, que infelizmente ocorrem como relativa freqüência.

(D.J.E. de 29.03.2011) – Processo nº. 0005538-70.2011.8.26-0100 Pedido de Providências Décimo Quinto Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo Sentença de fls. 24/26 – VISTOS. Cuida-se de representação formulada pelo 15º Oficial Registro de Imóveis, que informa ter averbado, por determinação do MM. Juízo da 78ª Vara do Trabalho, sob pena de multa e de responsabilidade penal, penhora no imóvel objeto da matrícula nº 206.619, daquela Serventia, com ofensa ao princípio da continuidade. O Ministério Público manifestou-se no sentido da manutenção da penhora em razão da recente orientação do STJ (fls. 20/22). É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Observe-se, de início, consoante reiterado posicionamento do E. Conselho Superior da Magistratura, que a origem judicial do título não o isenta de qualificação. Nesse sentido: “Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal, O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”. O Egrégio Conselho Superior da Magistratura tem decidido, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação cível n.413-6/7). Quanto ao mais, a recusa do Oficial está correta e encontra respaldo no princípio da continuidade que, de acordo com a doutrina de Afrânio de Carvalho, quer dizer que: “em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidade à vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente” (Registro de Imóveis, Editora Forense, 4ª Ed., p. 254). Na mesma senda, Narciso Orlandi Neto, in Retificação do Registro de Imóveis, Juarez de Oliveira, pág. 55/56, observa que: “No sistema que adota o princípio da continuidade, os registros têm de observar um encadeamento subjetivo. Os atos têm de ter, numa das partes, a pessoa cujo nome já consta do registro. A pessoa que transmite um direito tem de constar do registro como titular desse direito, valendo para o registro o que vale para validade dos negócios: nemo dat quod non habet”. O princípio da continuidade é tratado pela Lei nº 6015/73 em seus arts. 195 e 237, in verbis: “Art. 195 – Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro.”; e “Art. 237 – Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro.” No caso, uma vez que os titulares de domínio não se encontram no pólo passivo da ação trabalhista, a penhora não poderia mesmo ser averbada. A despeito do acerto do Oficial e de sua louvável cautela, que deve ser mantida em casos análogos para que sobre si não recaia qualquer tipo de responsabilidade, recentemente o E. STJ, no conflito de competência nº 106.446, relator Min. Sidnei Beneti, entendeu ser o juízo do Trabalho o único competente para decidir sobre o registro da carta de arrematação, incumbindo-lhe zelar pelo fiel cumprimento da Lei dos Registros Públicos. E se lhe cabe decidir sobre o mais, também é de sua competência decidir sobre o menos, que é a averbação da penhora. Diante desta nova orientação, malgrado o posicionamento deste juízo, que vinha sistematicamente cancelando os registros e averbações eivados de nulidade de pleno direito como a presente, o ato não pode ser cancelado. Posto isso, INDEFIRO a representação do Oficial de Registro de Imóveis. Com cópia desta e do r parecer do Ministério Público (notadamente para os fins do último parágrafo), oficie-se ao MM. Juízo da 78ª Vara do Trabalho. Sem prejuízo, deverá o Oficial de Registro de Imóveis intimar os titulares de domínio para, querendo e nas vias ordinárias, adotarem as medidas que julgarem cabíveis. P.R.I.C. São Paulo, 1 de março de 2011. Gustavo Henrique Bretas Marzagão. Juiz de Direito. CP. 47.  (grifei)

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  1. DécioBueno disse:

    Recentemente, fui surpreendido com uma multa imposta por uma Juiza do Trabalho, de 9.000,00, por “descumprimento” de ordem judicial. Um verdadeiro absurdo, já que o tal “descum primento” não ocorreu. Em todas as fases foi ela informada que o pagamento dos emolumentos devidos, para o registro e posterior cancelamento da pemhora é de responsabilidade do interessado, de quem, por óbvio, não poderia este Oficial cobrar, já que a determinação foi cumprida por Oficial de Justiça. Ingrtessamos, em Brasília, com Mandado de Segurança e informaremos quando julgado.

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