por Douglas de Campos Gavazzi*
O novo Código de Processo Civil, instituído pela Lei Federal 13.105 de 16 de março de 2015, com vacatio legis de um ano, previu no artigo 1.071 uma nova modalidade de propositura da usucapião: a forma extrajudicial.
A usucapião pela via administrativa, já havia sido veiculada no ordenamento pátrio por meio da Lei Federal nº 11.977/2009, com viés de promover a função social da propriedade através da regularização fundiária.
A usucapião notário-registral, prevista no NCPC, com alteração da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), sem prejuízo de se perquirir o judiciário, abarca todas as espécies de aquisição originária nesse sentido, se inicia no Tabelionato de Notas, por meio da lavratura de uma ata notarial com a finalidade de se fazer prova do fato e do tempo de prova, e da cadeia possessória, se caso for:
“Art. 216-A.Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com:
I – ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias; (grifei)
A ata notarial lavrada pelo tabelião, deverá ser acostada da planta e memorial descritivo assinado por engenheiro ou arquiteto devidamente habilitado, com do recolhimento da ART – Anotação de Responsabilidade Técnica. A planta deverá vir, também, assinada pelos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, bem como pelos proprietários dos imóveis confinantes.
Além disso, necessário se faz a juntada das certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente, justamente para comprovar a inexistência de ações possossórias e, portanto, a posse mansa e pacífica.
A ata lavrada pelo notário poderá fazer menção e constar a transcrição de título ou documento que demonstre a origem, a continuidade e a natureza da posse, podendo, inclusive, fazer constar da percepção do notário o pagamento de impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel no tempo de fruição do requerente.
Em um segundo momento, a ata e os documentos mencionados, deverá ser levada ao registrador imobiliário competente, que, diante de sua regularidade o autuará, protraindo o princípio da prioridade – prorroga-se o prazo da prenotação até o acolhimento ou a rejeição do pedido da usucapião.
O grande óbice do instituto, penso, está na redação negativa do parágrafo segundo do novel art. 216-A:
§ 2o Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, esse será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar seu consentimento expresso em 15 (quinze) dias, interpretado o seu silêncio como discordância. (grifei)
Aqui, deu-se tratamento diferenciado daquele previso no parágrafo 4º do inciso II do artigo 213 da LRP (retificação administrativa), no qual, lá, presumir-se-á a anuência do confrontante que deixar de apresentar impugnação no prazo da notificação feita pelo registrador. Na usucapião notário-registral, a inércia do confrontante é entendida como discordância, e portanto, ocasiona o indeferimento do Pleito, pelo registrador imobiliário.
Entretanto, caso presente todos os requisitos e as devidas anuências, o oficial registrador, a vista do pedido da usucapião, dará ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal e ao Município, por intermédio do oficial de registro de títulos e documentos, para que se manifestem, em 15 (quinze) dias, sobre o pedido. Essa ciência também poderá ser feita por meio de AR (Aviso de Recebimento). Mais uma vez, aguarda-se a manifestação do Estado, sobre o desinteresse no bem para o prosseguimento do pedido, lembrando sempre, que o silêncio é entendido como discordância.
Assim, após esses cuidados, o oficial promoverá a publicação de edital em jornal de grande circulação para a ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão se manifestar em 15 (quinze) dias. Neste caso, o silêncio é considerado, positivo ao requerente.
Outro ponto contundente da redação da usucapião extrajudicial, é o parágrafo 6º do mencionado artigo:
§ 6o Transcorrido o prazo de que trata o § 4o deste artigo, sem pendência de diligências na forma do § 5o deste artigo e achando-se em ordem a documentação, com inclusão da concordância expressa dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula, se for o caso. (grifei)
Ora, do dispositivo, extrai-se que a nova usucapião extrajudicial, necessita imprescindivelmente da anuência dos proprietários tabulares do imóvel usucapiendo, ou seja, se aquele que consta da matrícula como titular do direito de propriedade não concordar com o pleito, não haverá o prosseguimento pela via cartorial.
Mas qual o objetivo da lei se a maioria dos pedidos de usucapião ajuizados é justamente por não haver concordância do titular do domínio?
Cremos que o legislador, por questões políticas desconhecidas, entendeu que o novo instituto somente deve servir apenas para uma regularização fundiária malgrado não atender com sucesso o princípio constitucional da função social da propriedade.
Em qualquer caso, é sempre lícito ao interessado suscitar o procedimento de dúvida ao Corregedor Permanente do registrador imobiliário. Em havendo diligências, e ao final delas, se a documentação não estiver em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido, o que não impede o ajuizamento de ação de usucapião.
Interessante, é que o legislador previu um procedimento misto (extra-judicial): Impugnado o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, o oficial de registro de imóveis remeterá os autos ao juízo competente da comarca da situação do imóvel, cabendo ao requerente emendar a petição inicial para adequá-la ao procedimento comum. O Legislador ganhou competência para ajuizar a ação de usucapião? E se o Foro somente admitir processo digital, como será essa remessa?
São perguntas ainda sem respostas.
Pra que serve a usucapião extrajudicial então? Pensamos que servirá para resolver questões em que houve um negócio jurídico entre alienante e o adquirente, entretanto, por algum óbice registral o título não teve acesso ao fólio real. Usucapião com justo título.
Esse procedimento deverá ter uma duração média de 120 (cento e vinte) dias e a exemplo dos atos da Lei 11.441/07, será necessária a assistência jurídica de um advogado.
Esperamos que diante da complexidade apresentada, novas leis venham alterar o dispositivo contido no novo código processual, admitindo um procedimento mais útil à sociedade brasileira.
A usucapião pela via administrativa, já havia sido veiculada no ordenamento pátrio por meio da Lei Federal nº 11.977/2009, com viés de promover a função social da propriedade através da regularização fundiária.
A usucapião notário-registral, prevista no NCPC, com alteração da Lei 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), sem prejuízo de se perquirir o judiciário, abarca todas as espécies de aquisição originária nesse sentido, se inicia no Tabelionato de Notas, por meio da lavratura de uma ata notarial com a finalidade de se fazer prova do fato e do tempo de prova, e da cadeia possessória, se caso for:
“Art. 216-A.Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com:
I – ata notarial lavrada pelo tabelião, atestando o tempo de posse do requerente e seus antecessores, conforme o caso e suas circunstâncias; (grifei)
A ata notarial lavrada pelo tabelião, deverá ser acostada da planta e memorial descritivo assinado por engenheiro ou arquiteto devidamente habilitado, com do recolhimento da ART – Anotação de Responsabilidade Técnica. A planta deverá vir, também, assinada pelos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, bem como pelos proprietários dos imóveis confinantes.
Além disso, necessário se faz a juntada das certidões negativas dos distribuidores da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente, justamente para comprovar a inexistência de ações possossórias e, portanto, a posse mansa e pacífica.
A ata lavrada pelo notário poderá fazer menção e constar a transcrição de título ou documento que demonstre a origem, a continuidade e a natureza da posse, podendo, inclusive, fazer constar da percepção do notário o pagamento de impostos e taxas que incidiram sobre o imóvel no tempo de fruição do requerente.
Em um segundo momento, a ata e os documentos mencionados, deverá ser levada ao registrador imobiliário competente, que, diante de sua regularidade o autuará, protraindo o princípio da prioridade – prorroga-se o prazo da prenotação até o acolhimento ou a rejeição do pedido da usucapião.
O grande óbice do instituto, penso, está na redação negativa do parágrafo segundo do novel art. 216-A:
§ 2o Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, esse será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar seu consentimento expresso em 15 (quinze) dias, interpretado o seu silêncio como discordância. (grifei)
Aqui, deu-se tratamento diferenciado daquele previso no parágrafo 4º do inciso II do artigo 213 da LRP (retificação administrativa), no qual, lá, presumir-se-á a anuência do confrontante que deixar de apresentar impugnação no prazo da notificação feita pelo registrador. Na usucapião notário-registral, a inércia do confrontante é entendida como discordância, e portanto, ocasiona o indeferimento do Pleito, pelo registrador imobiliário.
Entretanto, caso presente todos os requisitos e as devidas anuências, o oficial registrador, a vista do pedido da usucapião, dará ciência à União, ao Estado, ao Distrito Federal e ao Município, por intermédio do oficial de registro de títulos e documentos, para que se manifestem, em 15 (quinze) dias, sobre o pedido. Essa ciência também poderá ser feita por meio de AR (Aviso de Recebimento). Mais uma vez, aguarda-se a manifestação do Estado, sobre o desinteresse no bem para o prosseguimento do pedido, lembrando sempre, que o silêncio é entendido como discordância.
Assim, após esses cuidados, o oficial promoverá a publicação de edital em jornal de grande circulação para a ciência de terceiros eventualmente interessados, que poderão se manifestar em 15 (quinze) dias. Neste caso, o silêncio é considerado, positivo ao requerente.
Outro ponto contundente da redação da usucapião extrajudicial, é o parágrafo 6º do mencionado artigo:
§ 6o Transcorrido o prazo de que trata o § 4o deste artigo, sem pendência de diligências na forma do § 5o deste artigo e achando-se em ordem a documentação, com inclusão da concordância expressa dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes, o oficial de registro de imóveis registrará a aquisição do imóvel com as descrições apresentadas, sendo permitida a abertura de matrícula, se for o caso. (grifei)
Ora, do dispositivo, extrai-se que a nova usucapião extrajudicial, necessita imprescindivelmente da anuência dos proprietários tabulares do imóvel usucapiendo, ou seja, se aquele que consta da matrícula como titular do direito de propriedade não concordar com o pleito, não haverá o prosseguimento pela via cartorial.
Mas qual o objetivo da lei se a maioria dos pedidos de usucapião ajuizados é justamente por não haver concordância do titular do domínio?
Cremos que o legislador, por questões políticas desconhecidas, entendeu que o novo instituto somente deve servir apenas para uma regularização fundiária malgrado não atender com sucesso o princípio constitucional da função social da propriedade.
Em qualquer caso, é sempre lícito ao interessado suscitar o procedimento de dúvida ao Corregedor Permanente do registrador imobiliário. Em havendo diligências, e ao final delas, se a documentação não estiver em ordem, o oficial de registro de imóveis rejeitará o pedido, o que não impede o ajuizamento de ação de usucapião.
Interessante, é que o legislador previu um procedimento misto (extra-judicial): Impugnado o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, o oficial de registro de imóveis remeterá os autos ao juízo competente da comarca da situação do imóvel, cabendo ao requerente emendar a petição inicial para adequá-la ao procedimento comum. O Legislador ganhou competência para ajuizar a ação de usucapião? E se o Foro somente admitir processo digital, como será essa remessa?
São perguntas ainda sem respostas.
Pra que serve a usucapião extrajudicial então? Pensamos que servirá para resolver questões em que houve um negócio jurídico entre alienante e o adquirente, entretanto, por algum óbice registral o título não teve acesso ao fólio real. Usucapião com justo título.
Esse procedimento deverá ter uma duração média de 120 (cento e vinte) dias e a exemplo dos atos da Lei 11.441/07, será necessária a assistência jurídica de um advogado.
Esperamos que diante da complexidade apresentada, novas leis venham alterar o dispositivo contido no novo código processual, admitindo um procedimento mais útil à sociedade brasileira.
* Douglas de Campos Gavazzi é tabelião substituto em Itapevi-SP. Professor na pós graduação em Direito Notarial e Registral Imobiliário da Escola Paulista de Direito – EPD-SP, do Instituto dos Notários e Registradores do Paraná – INOREG-PR e da UNIOES em Recife-PE. Professor na pós graduação nos cursos PROORDEM e ÊXITO em São Paulo, São José dos Campos, Santos, Campinas e Goiânia-GO.
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O presente artigo é uma reflexão pessoal do colunista e não a opinião institucional do CNB-CF.