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Artigo – As peripécias que acontecem em algumas decisões – Por Mônica Cecílio Rodrigues

Em um ambiente acadêmico sempre pululam comentários sobre decisões judiciais e suas contradições, quer sejam entre as próprias, quer seja com a norma. 
E em caso interessante a Corte Suprema Nacional decidiu reconhecer a pleiteada declaração de uma união estável, entre pessoas idosas, rechaçando a decisão do Tribunal Mineiro que achou por bem em restringir tal direito em razão da idade. 

Podemos classificar de surreal o acórdão do Tribunal. 

Para a composição de uma família não tem idade!!

Somente não se permite a constituição de uma família, nas duas modalidades reconhecidas pela legislação brasileira, caso as partes interessadas não tenham autonomia intelectiva, que comprometa a liberalidade das escolhas exigidas para a constituição deste instituto ou por proibição de coexistência de outra, caso contrário não se justifica o preconceito de pautar a impossibilidade desta união pela idade avançada. 

A ingerência estatal através da prestação jurisdicional deve-se limitar as exigências legais, não amplia-las e muito menos mingua-las. 

Além do mais, realmente, causa estranheza quando o mencionado Tribunal, especificamente nesta decisão, vê a união estável como “um arremedo, um simulacro, uma caricatura, um decalque” em um paralelo ao casamento. 

A decisão que ceiva o direito a união peca nesse sentido, mas devemos reconhecer a pertinência da exigência feita quanto a necessidade de provas robustas para o reconhecimento da união; e não deve ser de outra forma, sob pena criar uma avalanche de declarações sem a mínima característica de real família, visando tão somente a divisão patrimonial, quer seja como partilha ou direito sucessório; e, também o direito à previdência. 

Este assunto, das provas robustas, foi ventilado em um profícuo encontro em razão de existir decisões reconhecendo a união estável, com provas minguadas, colhidas por escrito de terceiros sobre a existência da mencionada união estável. 

A experiência, não só do exercício da advocacia consultiva, mas também litigiosa, como os estudos da academia, onde podemos ouvir relatos de diversas fontes, de pessoas abalizadas sobre decisões proferidas em processo onde se litigam direitos, não só materiais, mas processuais também, que envolvem família ou sucessão, por vezes estarrecem as incoerências existentes. 

Algumas vezes os Tribunais se contradizem tanto que nem mesmo entre eles há entendimento, com contrassensos escabrosos; por isto cabe ao Superior Tribunal a função nomofilácica para que tenhamos em nosso país decisões que assegurem a uniformidade da legislação federal. 

No caso ora em comento, a verdadeira justiça só foi garantida em nossa Mais Alta Corte, quando decidiu pela necessidade de provas robustas para o reconhecimento da união estável. E não deveria ser de outra forma, pois apesar da união estável não estar caracterizada pelo formalismo que é próprio do casamento, não se deve permitir qualquer prova para a sua existência. 

O direito ao reconhecimento da existência da união estável é ancorado no princípio da dignidade da pessoa humana que deseja ter uma família. 

A indignação expressada quando se depara com tantas divergências em julgados comparados, com narrativas fáticas iguais, é porque concluímos o quão frágil é o nosso sistema decisional. 

E isto não só assusta como também cria um comportamento desrespeitoso entre os cidadãos que precisarão amanhã destas decisões, porque por vezes esta confusão beneficia e permite a procrastinação destas questões, que tem valor moral, mas que podiam ser resolvidas com muito mais presteza do que o usual. 

Na verdade, a frase virtus in medium est deve ser utilizada nas questões de família, porque não pode ser nem tão fácil e nem tão difícil, mas justa as exigências para o reconhecimento do núcleo familiar, para que seja ceifado os oportunismos que possam vir a existir nestes casos. 

Dra. Mônica Cecílio Rodrigues – advogada, doutora em processo civil e professora universitária.  

Fonte: JM Online