Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 3000355-45.2013.8.26.0408, da Comarca de Ourinhos, em que é apelanteEDIVALDO ANDRÉ HERNANDES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE OURINHOS.
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DETERMINAR O REGISTRO DA ESCRITURA, V.U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.
São Paulo, 23 de fevereiro de 2015.
ELLIOT AKEL, RELATOR
Apelação Cível nº 3000355-45.2013.8.26.0408
Apelante: Edivaldo André Hernandes
Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Ourinhos
Voto nº 34.149
REGISTRO DE IMÓVEIS – DÚVIDA – ESCRITURA DE COMPRA E VENDA – ALIENANTES REPRESENTADOS POR MANDATÁRIO – FALECIMENTO DE DOIS DOS VENDEDORES MANDANTES – MANDATO NÃO EXTINTO – APLICAÇÃO DO ART. 686 DO CÓDIGO CIVIL – POSSIBILIDADE DE REGISTRO – RECURSO PROVIDO.
Trata-se de recurso de apelação tirado em face de sentença que manteve a recusa de registro de escritura de compra e venda, sob o argumento de que o mandato outorgado, em relação a dois dos vendedores, já estaria extinto, em razão de seu falecimento.
A apelante afirma que se trata de mandato outorgado para confirmação de negócio já encetado, aplicando-se, por isso, o art. 686 do Código Civil.
A dúvida foi julgada procedente, entendendo-se que o mandato se extingue pelo falecimento do mandante, a teor do art. 682, II, do Código Civil, e a extinção pela morte não se confunde com revogação, que é ato voluntário.
A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
O recurso comporta provimento.
Cuida-se, aqui, de escritura de compra e venda, em que figuraram diversos alienantes, todos representados por Fuad Cury. O comprador, ora interessado, pretende concretizar, com a anuência dos intervenientes cedentes, contrato particular, não levado a registro, mas presentemente quitado.
O registro foi negado porque dois dos vendedores, Inaiê Sá Trench Medeiros e João Batista Medeiros, já haviam falecido quando dá outorga da escritura. Segundo o Oficial, com esse falecimento extinguiu-se o mandato, nos termos do art. 682, II, do Código Civil.
O que se verifica, contudo, é que o mandato foi outorgado para a concretização de negócio anteriormente já encetado. A escritura de compra e venda visou finalizar o contrato preliminar. O mandato é, portanto, acessório de outro negócio, que já se iniciou, mas que carece de concretização. Em outras palavras, a transferência da propriedade, iniciada com o instrumento particular de compra e venda, concretiza-se com a lavratura e registro da escritura. E o mandato outorgado visou a essa concretização.
Aplica-se ao caso, então, a regra do art. 686, parágrafo único, do Código Civil: “É irrevogável o mandato que contenha poderes de cumprimento ou confirmação de negócios encetados, aos quais se ache vinculado.”
Não importa que o artigo trate da hipótese de revogação e não da extinção por morte. A razão da disposição é evitar que o mandato se extinga, quer por revogação, quer por morte, quando ele se ligue à execução de outro contrato, do qual seja acessório.
Cláudio Luiz Bueno de Godoy, em comentário ao art. 686, lembra: “É, por exemplo, o mandato conferido para pagamento de débitos, enfim para a execução de contratos, inclusive preliminares. São, no dizer de
Caio Mário, mandatos acessórios de outro contrato, ou mesmo cláusula dele constante (Instituições de Direito Civil, 10ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1999, vol. III, p. 265)”. E menciona, na jurisprudência, exatamente a hipótese do mandato utilizado para a lavratura de escritura de cumprimento de compromisso anterior, mesmo após a morte do mandante: RJTJESP 126/47. (Código Civil Comentado, Coord. Min. Cezar Peluso, 2ª ed., Manole, 2007, p. 642)
No mesmo sentido, Maria Helena Diniz preleciona que “prevalecerão, apesar do óbito do mandante, a procuração em causa própria (RT 502:66; CC art. 685, 2ª parte) e o mandato outorgado para dar escriturade venda de imóvel cujo preço já tenha sido recebido (AJ 100:149, 96:59, 97:71; RF 134:442). (Curso de Direito Civil Brasileiro, 28ª ed., vol. III, Saraiva, 2012, p. 424)
Em suma, inobstante o falecimento de dois dos vendedores, o mandato outorgado com o fim específico de concretizar a transmissão da propriedade, por meio da lavratura e registro da escritura de compra e venda, não se extinguiu.
Meu voto, à vista do exposto, dá provimento ao recurso para determinar o registro da escritura.
HAMILTON ELLIOT AKEL, Corregedor Geral da Justiça e Relator
Data de registro: 06 de março de 2015
Fonte: DJE/SP
APELAÇÃO CÍVEL Nº 066368-0/1
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 66.368-0/1, da Comarca de SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, em que é apelanteMARIALDA TROVATTI SEMEDO GONÇALVES e apelado o 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E TABELIÃO DE PROTESTO DE LETRAS E TÍTULOS da mesma Comarca. ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do relator que fica fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento, com votos vencedores, os
Desembargadores MÁRCIO MARTINS BONILHA, Presidente do Tribunal de Justiça, e ALVARO LAZZARINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça. São Paulo, 15 de fevereiro de 2001.
(a) LUÍS DE MACEDO,Corregedor Geral da Justiça e Relator
VOTO
REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida. Ingresso de escritura pública de venda e compra lavrada anteriormente à vigência da lei fed. nº 8.212/91. Falta de apresentação das certidões negativas de débitos do INSS e da Receita Federal. Pretensão de registro indeferida. Empresa falida. Situação exceptiva. Necessidade, no entanto, de autorização do Juízo falimentar. Recurso a que se nega provimento.
Trata-se de recurso interposto por Marialda Trovatti Semedo Gonçalves contra decisão que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 2º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São José do Rio Preto, e negou o ingresso de escritura pública de venda e compra sem a apresentação de certidões negativas de débitos para com o INSS e a Receita Federal, dentro do prazo de validade.
Sustentou a recorrente a reforma da decisão, que deveria ter julgado improcedente a dúvida, afirmando que a impossibilidade atual de cumprimento da exigência decorre do fato de que, por sentença prolatada em 01.7.98, do MM. Juiz da 1ª Vara Cível de São José do Rio Preto, foi decretada a falência da empresa vendedora. Sustentou, ainda, que a escritura fora lavrada anteriormente à vigência da lei fed. nº 8.212/91, quando ainda não havia a exigência da apresentação de CND do INSS e da Receita Federal, tendo se aperfeiçoado, na forma da lei então vigente, o ato jurídico.
A Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (f. 62/65 e 197). Foram juntados documentos (f. 70/196 e 201/210), com ciência ao recorrente e à Procuradoria Geral da Justiça.
É o relatório.
A controvérsia não se limita à discussão quanto ao momento da exigência da CND do INSS e da Receita Federal, expresso em lei como momento da alienação, e cujo melhor entendimento, nos termos de recentes decisões deste C. Conselho Superior da Magistratura, compreende tanto o da formalização do título como o do seu ingresso no registro imobiliário, dada a complexidade inerente à transmissão da propriedade imóvel.
Na espécie há de se decidir quanto à exigibilidade da apresentação de certidões negativas de débitos fiscais e previdenciários federais em face da apresentação para registro de título por meio da qual pessoa jurídica falida alienara, anteriormente à decretação da falência, direitos reais. Isso porque se cuida de pessoa jurídica cuja falência foi decretada por sentença do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de São José do Rio Preto, de 1º de julho de 1998, conforme certidão de f. 202.
Não se justifica, por tal razão, a exigência de certidões negativas da empresa falida, pois, decretada a quebra, inaugura-se um procedimento concursal: todas as dívidas da sociedade têm seu vencimento antecipado; as ações propostas contra a falida são suspensas e reunidas num único Juízo; o falido perde a disponibilidade de seus bens, que são arrecadados, inventariados e devem ser alienados em benefício de uma massa, nos termos previstos no dec.-lei nº 7.661/45.
O objetivo primário da legislação constitui, claramente, a proteção e a equalização dos credores, a fim de que, considerada a ordem de preferência derivada da natureza de cada obrigação, possam, mediante rateio e por classe, ser pagos com a alienação forçada do patrimônio da falida.
Mostra-se presente, pois, com a falência, situação exceptiva, não se justificando a exigência de apresentação das certidões negativas de débitos para com a previdência e o fisco federal. Ocorre, no entanto, que com a propositura da dúvida devem ser obrigatoriamente analisadas todas as questões pertinentes ao ingresso do título no registro imobiliário, não se limitando o julgamento à análise das questões já apreciadas, mas envolvendo uma nova qualificação do título, em todos os seus aspectos.
Neste contexto, embora afastado o óbice pertinente à necessidade de apresentação das certidões negativas, há outro relativo à efetivação do registro, consistente na necessidade de autorização judicial do juiz da falência. Tal autorização se mostra necessária porque, não obstante tenha a quebra ocorrido em data muito posterior à formalização do título agora levado a registro, já que o imóvel foi alienado a Inácio Antonio Gonçalves pela empresa M. A. Construção Civil Ltda., por meio da escritura pública lavrada em 05 de julho de 1985, no L. 357, f. 022 do 3º Tabelião de Notas de São José do Rio Preto, sua apresentação para registro se deu apenas em data posterior, tendo sido inicialmente prenotado em 09.10.98 e depois em 09.4.99, já em razão da suscitação da dúvida, incidindo, por tais razões, as regras do art. 215 da lei nº 6.015/73 e do art. 52, VII, do dec.-lei nº 7.661/45, impeditivas do registro.
Esse impedimento somente pode ser superado com expressa autorização do Juízo falimentar, único com competência para atestar que o imóvel em questão não está sujeito ao concurso de credores. Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
(a) LUÍS DE MACEDO, Relator e Corregedor Geral da Justiça