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“Nota-se a crescente importância da Convenção da Apostila de Haia para o comércio exterior brasileiro”

“Nota-se a crescente importância da Convenção da Apostila de Haia para o comércio exterior brasileiro”

Membros da Gerência de Inteligência de Mercado, Gustavo Ferreira Ribeiro e Matheus Augusto Santos Oliveira falam sobre a importância da Apostila de Haia para a economia brasileira no exterior.

O apostilamento de documentos, ato que certifica a autenticidade dos documentos públicos brasileiros no exterior, faz parte de um dos principais regramentos internacionais da Conferência de Haia sobre Direito Internacional Privado (HCCH). A operação deste ato, por basear-se na necessidade de validação por fé-pública, é realizada pelos cartórios de todo o Brasil desde a publicação do Decreto nº 8.660/2016, permitindo que documentos públicos fossem reconhecidos por todas as partes signatárias da Convenção sobre a Eliminação da Exigência de Legalização de Documentos Públicos Estrangeiros. Centésimo décimo segundo país a incorporar a Convenção em seu regramento, o Brasil faz parte de um dos 122 signatários da “Convenção da Apostila”.

Com o avanço do uso de soluções digitais nas serventias extrajudiciais do país e o sucesso das operações do e-Notariado para realização de atos notariais de forma online em todo o Brasil, foi confiado ao Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF), a gestão do Sistema Apostil que, desde sua criação, já em 2016, era realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A migração do sistema*, em projeto-piloto desde 2019, reacende o debate quanto à importância do apostilamento não apenas à vida cidadã, pelos documentos apostilados para solicitação de dupla cidadania ou vistos para estudos no exterior, mas também para o desenvolvimento econômico do país e a internacionalização de empresas e negócios.

A fim de entender melhor o papel dos apostilamentos nas transações de negócios brasileiros no exterior, como a internacionalização de empresas e o setor de exportações, o CNB/CF conversa com os membros da Gerência de Inteligência de Mercado da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), o coordenador de Acesso ao Mercado, Gustavo Ferreira Ribeiro e o analista de Acesso ao Mercado, Matheus Augusto Santos Oliveira.

CNB/CF – De que forma a Apostila de Haia contribui para a realização de negócios internacionais?

Matheus Augusto Santos Oliveira Ao estabelecer um padrão internacional de autenticação de origem para documentos públicos, a Convenção confere simplificação aos procedimentos administrativos voltados ao reconhecimento de documentos públicos essenciais aos negócios internacionais, outorgados pelo país de origem. Tal simplificação se manifesta em procedimentos administrativos mais rápidos, concluídos em menos etapas, tornando-os menos onerosos às operações empresariais. A simplificação de procedimentos administrativos é objetivo de diversas linhas de frente para a melhoria do ambiente de negócios no Brasil, que se traduzem em competitividade (eficiência) para empresas brasileiras. Em relação aos negócios internacionais, podem ser citadas as frentes do Acordo de Facilitação de Comércio da OMC (ver o Decreto n.º 9.326/2018), do Comitê Nacional de Investimentos (ver o Decreto n.º 9.885/2019), da Lei de Liberdade Econômica (Lei n.º 13.874/2019) e da Lei do Ambiente de Negócios (Lei n.º 14.195/2021).

CNB/CF – Qual a importância deste procedimento ser realizado de forma digital, com um sistema unificado e padronizado em todo o Brasil?

Matheus Augusto Santos Oliveira Dentre essas linhas de frente, a Convenção da Apostila também compartilha dos objetivos da Lei do Governo Digital (Lei n.º 14.129/2021), que incluem a digitalização dos procedimentos administrativos em nível federal. A digitalização de um procedimento administrativo como o apostilamento reduz o custo de transação da informação, sobretudo para múltiplas operações ao longo do tempo e para aquelas dispersas no território nacional.

CNB/CF – E como a realização do ato pelos cartórios brasileiros, uma instituição reconhecida por sua capilaridade, impulsiona as facilidades do apostilamento?

Matheus Augusto Santos Oliveira Nesse sentido, as empresas brasileiras que atuam no exterior de forma direta (internacionalização) ou indireta (exportação) e os investidores estrangeiros que constituem empresas brasileiras se beneficiam da Convenção da Apostila, através de um procedimento administrativo de apostilamento singular, simplificado e convergente, conduzido de forma descentralizada no território nacional pelo serviço notarial e de forma digital pelo sistema Apostil. Essa estrutura confere eficiência ao tratamento administrativo de documentos públicos necessários aos negócios internacionais.

Deve-se estar atento ao dispositivo acerca da não aplicação da Convenção quanto a documentos comerciais e alfandegários (artigo 1º, segundo item “b” do Decreto n.º 8.660/2016 ou artigo 1º item 3-b do texto original). Embora essa exclusão sugira sua relativa inaplicabilidade ao comércio, o manual do HCCH (página 37, parágrafo 147) esclarece que tal exclusão decorre da condição em que foi negociada a Convenção, composta em sua maioria por países europeus que, à época, já não exigiam a legalização desses documentos, em linha com o GATT 19472. Na prática, ainda segundo o manual, as Partes efetivamente aplicam o apostilamento para os documentos comerciais e alfandegários de natureza pública que tinham a sua legalização exigida previamente à ratificação da Convenção. Nesses casos, o apostilamento cumpre a sua função de simplificar o procedimento administrativo requerido pelo regramento da Parte em questão.

CNB/CF – De acordo com os dados da Apex-Brasil, qual o impacto do Brasil ser país signatário da Convenção no setor de exportações do país?

Matheus Augusto Santos Oliveira Em relação às empresas exportadoras, segundo o Comex Stat, a maior parcela (56%) da pauta de exportações brasileira em 2021 foi destinada a alguma das 121 Partes da Convenção (além do Brasil). Excluída a China da pauta, 82% das exportações brasileiras foram destinadas a algum desses 121 mercados, parcela superior aos 77% da pauta extra-China de 2016 destinada a alguma das 111 Partes da Convenção à época. Com isso, nota-se a crescente importância da Convenção para o comércio exterior brasileiro desde a sua incorporação em 2016. Em relação ao investimento estrangeiro direto (IED), essa importância é ainda mais evidente. Segundo dados do Banco Central do Brasil (BCB), de 2016 a 2020, mais de 90% do estoque de IED no Brasil têm origem em alguma Parte como investidor imediato.

CNB/CF – E quanto aos investimentos brasileiros no exterior?
Matheus Augusto Santos Oliveira – Para o investimento brasileiro no exterior, segundo o BCB, mais de 60% do estoque de investimentos brasileiros aportados internacionalmente de 2016 a 2020 foram destinados a empresas estrangeiras de Partes da Convenção. Esses dados demonstram a importância da Convenção da Apostila para o bom funcionamento dos negócios internacionais relacionados ao Brasil, ao compreender uma parcela significativa da pauta comercial e de investimentos no país. Em função disso, a Câmara de Comércio Internacional (ICC, no acrônimo em inglês) encorajou a adesão internacional à Convenção em 2016. Um trâmite administrativo simples e eficiente perfaz a tomada de decisão de investir no Brasil e comprar produtos brasileiros no exterior, bem como aquela voltada à inserção internacional de empresas brasileiras.

CNB/CF – Desde maio de 2020 vemos um aumento na solicitação de Apostilamentos por juntas comerciais e outras pessoas jurídicas. Quais outros fatores contribuem para o interesse de empresas brasileiras em exportar e se internacionalizar?

Matheus Augusto Santos Oliveira Ainda que um aumento na solicitação de apostilamentos possa ser indicativo da retomada dos negócios internacionais brasileiros, são inúmeros os fatores que influenciam a tomada de decisão empresarial, os quais não compreendem apenas as condições do ambiente de negócios do Brasil. Cenário macroeconômico, condições intrafirma, imagem nacional e integração regional (extranacional) são alguns outros conjuntos de fatores que influenciam a atividade econômica em nível internacional. Por fim, cabe mencionar os principais parceiros brasileiros que ainda não são Parte da Convenção, em ordem decrescente de valor transacionado.  Em relação às exportações brasileiras, esses são China, Canadá, Malásia, Tailândia, Vietnã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita, Egito, Irã e Bangladesh.  Em relação ao IED, esses são Canadá, Ilhas Virgens Britânicas, Ilhas Cayman, Bermudas e Ilhas Jersey. Em relação ao investimento brasileiro no exterior, esses são Ilhas Cayman, Ilhas Virgens Britânicas, Bermudas e Canadá.

*A migração do Sistema Apostil ocorre conforme Acordo de Cooperação Técnica firmado entre a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Brasil (Arpen/BR), o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), o Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB), a Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR).