Inventário litigioso e consensual, testamento vital, arbitragem e mediação em âmbito notarial fortalecem a atividade em Portugal.
Lisboa (Portugal) – As novas atribuições do notariado português – como o inventário e o testamento vital – e um debate sobre o processo de desvalorização da atividade notarial no País marcaram as apresentações do segundo dia de palestras do 3º Congresso do Notariado Português, promovido pela Ordem dos Notários de Portugal (ON) no Centro Cultura de Belém, na cidade de Lisboa.
A Mesa Redonda intitulada “Atos Notariais” contou com a presença de notários, solicitadores, advogados e docentes para avaliar as dificuldades introduzidas nas profissões jurídicas em razão da delegação de atribuições notariais a particulares sem a necessária formação jurídica para a prática de atos.
Entre os presentes, a unanimidade de que a contrarreforma recentemente implantada pelo Governo dificultou a vida do cidadão que não sabe a qual profissional recorrer quando necessita de instrumento notarial que lhe garanta a segurança jurídica. “Portugal tem sido um País experimental, onde convivem os sistemas latino, anglo-saxão e estatal, e onde nenhum deles acaba por funcionar de maneira adequada”, disse Tiago Relva, vice-presidente da ON.
José luís Bruguês, coordenador do gabinete de recuperação de ativos da Polícia Judiciária afirmou que o desmembramento de funções entre as diversas profissões jurídicas dificulta o trabalho de localização de crimes financeiros e documentos comprobatórios. “Se tudo estivesse como antes, apenas com o notário, em um único local, sujeito às mesmas regras de arquivamento e acesso, todo o processo seria muito mais fácil e rápido”, constatou.
A professora Maria Manuel Veloso, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra falou sobre a responsabilidade civil do Estado nos atos praticados pelos notários e pelos profissionais liberais que agora praticam atos notariais. Para a professora, embora a jurisprudência aponte que o Estado responde solidariamente pelos atos praticados pelos notários, como profissionais liberais a responsabilidade caberia apenas ao notário, assim como aos advogados e solicitadores.
A advogada Mônica Quintela e o solicitador Paulo Teixeira falaram sobre as atribuições notariais que lhes foram conferidas, como autenticações, reconhecimentos e escrituras, mas criticaram “a confusão jurídica” estabelecida no País. “Retiraram atribuições exclusivas dos notários e as passaram aos advogados e agora retiraram atribuições exclusivas da magistratura e passaram ao notário, criando uma insegurança jurídica total ao cidadão e às empresas”, disse a representante do Conselho Geral da Ordem dos Advogados.
Testamento vital no notariado
Coube à mesa de debates “Notariado e Proteção” debater o diploma legal de 2012 que conferiu ao notariado português a prática dos chamados “testamentos vitais”. Embora o ato já venha sendo praticado nas notarias, o debate ficou em torno dos procedimentos necessários para a revalidação destes testamentos, principalmente quando há mudança na vontade do testador.
“No caso de testamento vital feito por procuração, o procurador acaba tendo mais tempo que o doente para renovar o testamento”, apontou o notário Eduardo Marques Fernandes ao se referir à obrigatoriedade de renovação do testamento após cinco anos. Já André Dias Pereira, professor da Faculdade de Coimbra, valorizou a atuação notarial no procedimento, um dos mais importantes momentos da área médica, ao tratar de doentes terminais.
Apresentando a visão médica do novo instrumento, Paulo Sancho, consultor jurídico da Ordem dos Médicos destacou que na visão dos médicos o testamento vital “deveria ser meramente indicativo, pois o direito não pode entrar na prática médica”. No entanto ressaltou a importância do ato, quando praticado com a finalidade de defesa dos interesses do doente, de forma livre e esclarecida, como se o doente, ainda capaz, estivesse decidindo naquele instantes”.
Com uma apresentação em outra vertente, a professora de Direito de Família da Universidade de Coimbra Paula Vítor defendeu a criação de novos instrumentos notariais, entre eles o mandato de representação permanente e a ampliação do conceito de testamento vital, para a gestão de patrimônio de pessoas incapazes que no momento da prática do ato ainda não tenham sua incapacidade declarada. Instrumentos como a autotutela, faculdade de designar o próprio tutor ou excluir alguém já é uma figura consagrada na Espanha, por meio da escritura pública, baseada no aconselhamento do notário.
“Além deste ato, penso em um mandato permanente, que outorgue poderes de representação na eventualidade de que o cidadão se torne incapaz de tomar decisões sobre a área patrimonial e o conceito de patrimônios transmitidos, deixando consagrada a transferência da administração dos bens a um terceiro que o administre em nome de um beneficiário incapaz”, finalizou.
Por fim, João Ricardo Menezes, membro da diretoria da ON falou sobre a plataforma internacional para o tráfego de atos transfronteiriços de bens, pessoas e sociedades, permitindo o conhecimento do código Civil de cada um dos 27 países da União Europeia. “Além disso trabalhamos na construção de uma plataforma que permita a identificação sobre a existência de testamentos nos países europeus, e na finalização do projeto do certificado europeu, que será emitido pelo notário.”
Menezes chamou a atenção para a profunda alteração que haverá na União Europeia a partir de 2015, quando em matéria sucessória passarão a valer as regras do País de residência do falecido e não mais as do País de origem, ressalvados os casos em que os cidadãos optarem de maneira formal pelos sistemas de seus países de origem.
Mesa Redonda: Família e Sucessões
A prática do inventário – litigioso e não litigioso – por notários em Portugal foi o tema da última mesa de debates do segundo dia de apresentações no Centro Cultural de Belém. Coube à juíza de Direito da primeira Vara Cível de Lisboa, Carla Câmara conduzir as apresentações do painel, onde defendeu entusiasticamente a nova atribuição notarial.
Para a magistrada, o diploma 23 de 2013 representa “um grande desafio aos notários, uma vez que requer estudo e preparação para o exercício do processo civil, uma atividade que não se encontra na prática diária consagrada notarial”. Segundo a juíza, as questões relacionadas à inconstitucionalidade da lei caem por terra uma vez que cabe ao notário tramitar todos os atos e termos do inventário e ao juiz emitir a sentença homologatória da partilha, não excluindo assim a atribuição constitucional reservada ao magistrado.
“A iniciativa é muito boa, trata-se de um bom diploma legal, pois descongestiona os Tribunais e delega a um profissional qualificado um ato de tramitação de atos, que envolve muitas etapas e muitas vezes requer apenas o cumprimento de procedimentos legais”, afirmou. Por fim, a magistrada destacou que desde a edição da lei, processos que levavam em média 5 ou 6 anos já estão concluídos em poucos meses.
Coube ao professor da Universidade Católica Portuguesa, Henrique Sousa Antunes falar sobre a experiência do centro de formação de arbitragem e mediação existente na faculdade. Já o procurador geral adjunto João Ferreira Pinto defendeu uma maior participação do Ministério Público no processo de inventário, no que tange à defesa de interesses de menores e incapazes.
Já a notária e professora da Universidade de Lisboa, Sofia Henriques definiu a nova atribuição notarial como uma “arbitragem implícita”, que pode ser impugnada em qualquer momento por um dos interessados, e que está sujeita ao “controle de legalidade e não só uma mera homologação por parte do magistrado”. Segundo a professora é “prudente e mais pragmático concentrar o controle do processo no momento final, sendo que a parte pode optar por bloquear a ação do notário caso não concorde com sua decisão”. “O juiz poderá verificar todas as decisões tomadas pelo notário ao longo do processo”, finalizou.
Inventário litigioso e consensual, testamento vital, arbitragem e mediação em âmbito notarial fortalecem a atividade em Portugal. Lisboa (Portugal) – As novas atribuições do notariado português – como o inventário e o testamento vital – e um debate sobre o processo de desvalorização da atividade notarial no País marcaram as apresentações do segundo dia de palestras do 3º Congresso do Notariado Português, promovido pela Ordem dos Notários de Portugal (ON) no Centro Cultura de Belém, na cidade de Lisboa. A Mesa Redonda intitulada “Atos Notariais” contou com a presença de notários, solicitadores, advogados e docentes para avaliar as dificuldades introduzidas nas profissões jurídicas em razão da delegação de atribuições notariais a particulares sem a necessária formação jurídica para a prática de atos. Entre os presentes, a unanimidade de que a contrarreforma recentemente implantada pelo Governo dificultou a vida do cidadão que não sabe a qual profissional recorrer quando necessita de instrumento notarial que lhe garanta a segurança jurídica. “Portugal tem sido um País experimental, onde convivem os sistemas latino, anglo-saxão e estatal, e onde nenhum deles acaba por funcionar de maneira adequada”, disse Tiago Relva, vice-presidente da ON. José luís Bruguês, coordenador do gabinete de recuperação de ativos da Polícia Judiciária afirmou que o desmembramento de funções entre as diversas profissões jurídicas dificulta o trabalho de localização de crimes financeiros e documentos comprobatórios. “Se tudo estivesse como antes, apenas com o notário, em um único local, sujeito às mesmas regras de arquivamento e acesso, todo o processo seria muito mais fácil e rápido”, constatou. A professora Maria Manuel Veloso, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra falou sobre a responsabilidade civil do Estado nos atos praticados pelos notários e pelos profissionais liberais que agora praticam atos notariais. Para a professora, embora a jurisprudência aponte que o Estado responde solidariamente pelos atos praticados pelos notários, como profissionais liberais a responsabilidade caberia apenas ao notário, assim como aos advogados e solicitadores. A advogada Mônica Quintela e o solicitador Paulo Teixeira falaram sobre as atribuições notariais que lhes foram conferidas, como autenticações, reconhecimentos e escrituras, mas criticaram “a confusão jurídica” estabelecida no País. “Retiraram atribuições exclusivas dos notários e as passaram aos advogados e agora retiraram atribuições exclusivas da magistratura e passaram ao notário, criando uma insegurança jurídica total ao cidadão e às empresas”, disse a representante do Conselho Geral da Ordem dos Advogados. Testamento vital no notariado Coube à mesa de debates “Notariado e Proteção” debater o diploma legal de 2012 que conferiu ao notariado português a prática dos chamados “testamentos vitais”. Embora o ato já venha sendo praticado nas notarias, o debate ficou em torno dos procedimentos necessários para a revalidação destes testamentos, principalmente quando há mudança na vontade do testador. “No caso de testamento vital feito por procuração, o procurador acaba tendo mais tempo que o doente para renovar o testamento”, apontou o notário Eduardo Marques Fernandes ao se referir à obrigatoriedade de renovação do testamento após cinco anos. Já André Dias Pereira, professor da Faculdade de Coimbra, valorizou a atuação notarial no procedimento, um dos mais importantes momentos da área médica, ao tratar de doentes terminais. Apresentando a visão médica do novo instrumento, Paulo Sancho, consultor jurídico da Ordem dos Médicos destacou que na visão dos médicos o testamento vital “deveria ser meramente indicativo, pois o direito não pode entrar na prática médica”. No entanto ressaltou a importância do ato, quando praticado com a finalidade de defesa dos interesses do doente, de forma livre e esclarecida, como se o doente, ainda capaz, estivesse decidindo naquele instantes”. Com uma apresentação em outra vertente, a professora de Direito de Família da Universidade de Coimbra Paula Vítor defendeu a criação de novos instrumentos notariais, entre eles o mandato de representação permanente e a ampliação do conceito de testamento vital, para a gestão de patrimônio de pessoas incapazes que no momento da prática do ato ainda não tenham sua incapacidade declarada. Instrumentos como a autotutela, faculdade de designar o próprio tutor ou excluir alguém já é uma figura consagrada na Espanha, por meio da escritura pública, baseada no aconselhamento do notário. “Além deste ato, penso em um mandato permanente, que outorgue poderes de representação na eventualidade de que o cidadão se torne incapaz de tomar decisões sobre a área patrimonial e o conceito de patrimônios transmitidos, deixando consagrada a transferência da administração dos bens a um terceiro que o administre em nome de um beneficiário incapaz”, finalizou. Por fim, João Ricardo Menezes, membro da diretoria da ON falou sobre a plataforma internacional para o tráfego de atos transfronteiriços de bens, pessoas e sociedades, permitindo o conhecimento do código Civil de cada um dos 27 países da União Europeia. “Além disso trabalhamos na construção de uma plataforma que permita a identificação sobre a existência de testamentos nos países europeus, e na finalização do projeto do certificado europeu, que será emitido pelo notário.” Menezes chamou a atenção para a profunda alteração que haverá na União Europeia a partir de 2015, quando em matéria sucessória passarão a valer as regras do País de residência do falecido e não mais as do País de origem, ressalvados os casos em que os cidadãos optarem de maneira formal pelos sistemas de seus países de origem. Mesa Redonda: Família e Sucessões A prática do inventário – litigioso e não litigioso – por notários em Portugal foi o tema da última mesa de debates do segundo dia de apresentações no Centro Cultural de Belém. Coube à juíza de Direito da primeira Vara Cível de Lisboa, Carla Câmara conduzir as apresentações do painel, onde defendeu entusiasticamente a nova atribuição notarial. Para a magistrada, o diploma 23 de 2013 representa “um grande desafio aos notários, uma vez que requer estudo e preparação para o exercício do processo civil, uma atividade que não se encontra na prática diária consagrada notarial”. Segundo a juíza, as questões relacionadas à inconstitucionalidade da lei caem por terra uma vez que cabe ao notário tramitar todos os atos e termos do inventário e ao juiz emitir a sentença homologatória da partilha, não excluindo assim a atribuição constitucional reservada ao magistrado. “A iniciativa é muito boa, trata-se de um bom diploma legal, pois descongestiona os Tribunais e delega a um profissional qualificado um ato de tramitação de atos, que envolve muitas etapas e muitas vezes requer apenas o cumprimento de procedimentos legais”, afirmou. Por fim, a magistrada destacou que desde a edição da lei, processos que levavam em média 5 ou 6 anos já estão concluídos em poucos meses. Coube ao professor da Universidade Católica Portuguesa, Henrique Sousa Antunes falar sobre a experiência do centro de formação de arbitragem e mediação existente na faculdade. Já o procurador geral adjunto João Ferreira Pinto defendeu uma maior participação do Ministério Público no processo de inventário, no que tange à defesa de interesses de menores e incapazes. Já a notária e professora da Universidade de Lisboa, Sofia Henriques definiu a nova atribuição notarial como uma “arbitragem implícita”, que pode ser impugnada em qualquer momento por um dos interessados, e que está sujeita ao “controle de legalidade e não só uma mera homologação por parte do magistrado”. Segundo a professora é “prudente e mais pragmático concentrar o controle do processo no momento final, sendo que a parte pode optar por bloquear a ação do notário caso não concorde com sua decisão”. “O juiz poderá verificar todas as decisões tomadas pelo notário ao longo do processo”, finalizou. |
Atualizada em 11/03/14 |