De acordo com o relator, não vingam os argumentos apresentados de que, com a Emenda à Constituição nº 66/2010, o instituto da separaçãofoi abolido do ordenamento jurídico.Não é o que defende a comunidade jurídica, como por exemplo, Lênio Streck, um dos principais constitucionalistas do País, para quem é inconstitucional "repristinar" a separação judicial no Brasil. Segundo ele, em artigo publicado no Conjur, a separação judicial fundamenta-se em forte rastro ideológico-religioso. O Estado, segundo ele, “imiscuía-se na própria vontade do brasileiro de não permanecer casado e, mais que isso, exortava-o sutilmente a agir de modo contrário e a retomar o casamento. Hoje, é certo que esse tipo de intromissão do Estado na vida dos casais fere claramente a secularização”, defendeu ele.
De acordo com Streck, o legislador impusera aos cônjuges, não mais desejosos de permanecerem juntos, a obrigação de percorrerem uma espécie de calvário, que se caracterizava por um dualismo legal, como condição para que o casamento se dissolvesse de modo definitivo. Com a EC 66, “a separação foi varrida do mapa jurídico”, garantiu.
Em números – Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a própria sociedade abandonou a opção pela separação judicial. Em 2010 foram 243.224 divórcios, por meio de processos judiciais ou escrituras públicas, e as separações totalizaram 67.623 processos ou escrituras. Em 2011 foram 351.153 divórcios e 7.774 separações. Menos de 8 mil separações judiciais em todo o Brasil. Para o presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – Ibdfam, Rodrigo da Cunha Pereira, estes números mostram que além de ter sido abolida do ordenamento jurídico brasileiro, a separação judicial caiu em desuso. ”Querem a todo custo voltar a abarrotar o Judiciário brasileiro. Já não temos processos demais? ”
Segundo ele, há uma jurisprudência minoritária de que existe ainda o instituto da separação judicial. Mas defende que não há mais a separação, primeiro, porque não há necessidade, e, segundo, porque a volta da separação judicial significa voltar a discutir culpa pela dissolução conjugal, o que “é um dos maiores sinais de atraso do ordenamento jurídico brasileiro. O pensamento jurídico evoluiu, não temos mais que falar em culpa, mas em responsabilidade”, garantiu.
Para ele, a separação judicial era um resquício de interferência da Igreja que só admitiu o divórcio no Brasil numa composição de forças em 1977, de que só seria possível divorciar-se se se mantivesse a separação judicial, portanto isso é de ordem religiosa. “A separação é como se fosse um purgatório, um limbo entre o casamento e o estado de divorciado: você não é nem casado, nem divorciado, você não é nada, portanto é um fator desnecessário na vida das pessoas”, argumentou.
“Na prática a separação é uma coisa morta, não serve para nada, só para prorrogar sofrimento, para estimular brigas alimentar falsas esperanças em quem não quer se divorciar, não quer acabar com o casamento. Quem quer um tempo para pensar um pouco, pode simplesmente fazer uma separação de corpos. A questão da separação, além de discutir culpa, tornou-se uma questão de mercado para que as pessoas possam ficar estimulando a briga e aumentando os processos judiciais. E isso não tem mais lugar na nossa sociedade”, disse.
Constituição soberana – Para o constitucionalista Lênio Streck, o legislador ordinário tem liberdade de conformação para alterar o sistema constitucional estabelecido pela EC 66? ”A resposta é escandalosamente negativa, sob pena de aceitarmos, daqui para a frente, que uma lei ordinária possa vir a alterar a Constituição recentemente modificada. Simples assim. Não dá para estabelecer por lei ordinária aquilo que o constituinte derivado derrogou!”.
Lênio streck defende que devemos deixar a separação de fora do novo CPC em nome da Constituição. ”E isso por dois motivos: a um, por ela mesma, porque sacramenta a secularização do direito, impedindo o Estado de “moralizar” as relações conjugais; a dois, pelo fato de o legislador constituinte derivado já ter resolvido esse assunto. Para o tema voltar ao “mundo jurídico”, só por alteração da Constituição. E ainda assim seria de duvidosa constitucionalidade”, argumentou.
”Sem chance de o novo CPC repristinar a separação judicial (nem por escritura pública, como consta no Projeto do CPC). É inconstitucional”. Segundo ele, seria o fim do constitucionalismo. Ele espera que o legislador que aprovará o novo CPC se dê conta disso e evite um périplo de decisões judiciais no âmbito do controle difuso ou nos poupe de uma ação direta de inconstitucionalidade. ”O Supremo Tribunal Federal já tem trabalho suficiente”, concluiu.
Fonte: Ibdfam