O Superior Tribunal de Justiça foi criado em 1988, com a promulgação da Constituição Federal. Em menos de um ano, estava instalado, em Brasília, como a corte responsável por dizer como a legislação infraconstitucional deve ser interpretada. Desde então, é muito difícil estudar Direito Civil sem acompanhar a evolução da jurisprudência do STJ nas mais diversas matérias, como Direito do Consumidor, Direito de Família e Direito Privado.
Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, da 2ª Seção do STJ, vieram do tribunal as principais propostas de atualização no Direito Civil que originaram importantes mudanças legislativas.
Em palestra nesta terça-feira (15/8) no Congresso Internacional de Direito, da Faculdade de Direito da USP, ele destacou a importância das decisões do STJ para a consolidação do princípio da boa-fé objetiva e da função social do contrato, dois conceitos que nortearam o Código Civil de 2002.
Entre essas mudanças jurisprudenciais estão as que deram origem ao Código de Defesa do Consumidor. Salomão citou o exemplo do Recurso Especial 4.968, julgado em 1991 e relatado pelo ministro Sálvio de Figueiredo, que definiu: “A defesa do consumidor, hoje elevada a patamar constitucional, deve merecer do julgador exegese sistêmica, sob pena de ofensa ao ordenamento jurídico”.
“A decisão é posterior ao código, mas mostra como a jurisprudência da corte já continha os princípios de proteção da parte juridicamente e tecnicamente mais fraca na relação de consumo”, comentou Salomão.
Outro exemplo citado pelo ministro é o da definição, pelo STJ, dos conceitos de consumidor e fornecedor usando o critério da vulnerabilidade. Em 2004, no REsp 541.867, a corte decidiu que quem compra um produto com o objetivo de “implementar ou incrementar sua atividade comercial” não está numa relação de consumo, mas, sim, numa “atividade de consumo intermediária”. Em 2011, no Agravo 1.316.667, a corte definiu que o consumidor intermediário pode ser protegido pelo CDC se demonstrar “sua vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica frente à outra parte”.
Famílias modernas
“O STJ não descurou de levar em conta as modificações dos usos e costumes da sociedade, refletindo essa evolução em seus julgamentos”, disse o ministro, em sua palestra. O principal exemplo citado por ele é o da igualdade de direitos entre filhos “legítimos”, adotivos e os extraconjugais, especialmente para efeito patrimonial e de herança.
As Constituições anteriores faziam distinção entre os filhos tidos dentro do casamento, fora ou os adotados. Mas o artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição de 1988 passou a dizer que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
Segundo Salomão, mesmo lei específica sobre o assunto, a jurisprudência do STJ foi dando efetividade ao mandamento constitucional. Em 2005, no REsp 260.079, a 4ª Turma decidiu que “ocorrida a morte da autora da herança em 1989, quando já em vigor o artigo 227, parágrafo 6º, da Constituição Federal, vedando qualquer tipo de discriminação entre os filhos havidos ou não do casamento, ou os adotivos, a recorrida, ainda que adotada em 1980, tem direito de concorrer aos bens deixados pela falecida, em igualdade de condições com os outros filhos”.
Mais recentemente, a 4ª Turma decidiu, no REsp 1.279.624, que os filhos extraconjugais têm direito de figurar na sucessão mesmo depois do fim do inventário. O relator foi o ministro Luis Felipe Salomão.
Fonte: Conjur