O TOCADOR DE BANDONEON

Fui dedurado. Pior, fui dedurado por um amigo. Por isso agora vem a calhar aquele velho adágio popular: “Para que inimigos, com amigos assim”? 

Um argentino perguntaria: “Cómo se le nombra a la persona que informa a un tercero acerca de las cosas sigilosas, a los delictos, etc. de uno… El que cuenta cosas que no debe de contar a alguien…”? 

Com o aquiescência do Eduardo, e do bom espanhol, respondo: “Acá en Brasil lo nombramos dedo-duro”.

O resto do Brasil inteiro não sabia, e agora sabe. Era segredo, e agora não é mais segredo. Fui dedurado. Fui dedurado por um dedo-duro! 

Sim, um dedo-duro espalhou o segredo para o Brasil inteiro, tanto que agora não é mais segredo. 

Sim, confesso, réu confesso: tentei ser um tocador de bandoneon. Claro, não esperava ser nenhum Maradona do bandoneon, nenhum Carlos Gardel, nenhum Astor Piazzolla, nenhum grande bandoneonista. Somente um bandoneonista, um pequeno e nada mais que um pequeno bandoneonista, enfim!

Pobre de mim. Comprei o bandoneon, ensaiei por anos, e tudo o que consegui, ao longo destes anos todos foi tornar-me um mágico, fazendo desaparecer as pessoas ao redor de mim, pois bastava abrir o fole para que as pessoas sumissem. 

Confesso, é verdade, sim. Tentei, juro que tentei. Mas não é verdade que eu somente soubesse tocar uma única música. Eu apenas nunca consegui tocar música alguma. Uma pena: como se pode ouvir aqui, é lindo o som de um bandoneon.

Por isso, desiludido da vida, um dia vendi o bandoneon, que era argentino – acho que foi por isso que não consegui me adaptar ao instrumento – porque, definitivamente, não era o meu instrumento, e com o dinheiro apurado no negócio comprei um código civil brasileiro.

É por isso que eu afirmo, agora, com a maior convicção, porque comprei e porque estudei o código civil brasileiro, que não vale nada, absolutamente nada, a cessão de direitos hereditários feita por instrumento particular, porque, definitivamente, o instrumento particular não é o instrumento próprio para a cessão de direitos hereditários: a lei exige, sempre, a escritura pública.

Infelizmente tenho visto por aí – e não são tão poucos, alguns inventários e partilhas, feitos na esfera judicial, contendo em seu bojo instrumentos particulares de cessão de direitos hereditários. São atos nulos.

E é por isso também que afirmo, outra vez convicto: antes fossem bandoneonistas, estes juristas. Ou mágicos!

 

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EXIBINDO 0 COMENTÁRIOS

  1. JOSE ANTONIO ORTEGA RUIZ disse:

    Talvez o que vá falar, seja só para mim mesmo, pois quem o conhece sabe e muito. Mas o Senhor, mesmo “réu confesso”, pode não ser o grande bandonista que desejavas, mas que é “bom de escrita”, isso, convenhamos o Senhor é mestre. E parece que aguçaram agora com esses “intrigueiros da oposição”, “difamando-lhe” e “dedurando-o” de forma “brutal”, inflamando-lhe o seu lado saudosista “chefroforaerofusca”, o que abrilhanta ainda mais suas deixas, com pitacos de conhecimento. Que venha o nosso CONSELHO FEDERAL DO NOTARIADO BRASILEIRO, para acabar de vez com essas malsinadas investidas e essas nulidades jurídicas camufladas por setores que ainda nos difamam e desconhecem (???) os atos juridicos perfeitos. Parabens.

  2. ilceo disse:

    Por acasso serei jo? Perguntava Judas ao Divino Mestre, pouco antes da traição. Por acaso serei eu, pergunto, depois de ler assombrado, o dedo-duro da tua história? Se foi, e tenho certeza que foi, não penses que vou pedir desculpas. Pelo contrário. Estou te ameaçando. Vou contar pra tudo mundo sobre as cotoveladas que tu costumavas dar nos jogos de futebol e também vou transmitir para o cosmo a história do três vermelho. Ou estás esquecido disso? E fica tudo por conta da eterna rivalidade entre o acordeonista e o bandoneonista (eta palavra difícil). E se eu soubesse que querias vender teu bandoneon, com certeza, mesmo sendo argentino, teria comprado, com o devido instrumento particular de cessão de direitos, com ou sem valor jurídico, que isso é só tu que entende. E à prazo, é lógico. E procura no teu e-mail que as tuas cotoveladas já renderam uma história, por enquanto ainda não divulgada, para o teu bem.

  3. Jean-Pierre disse:

    Uma pena que vendeste o instrumento, amigo. Se não, poderíamos começar de novo… Um Abraço, Jean-Pierre

  4. J. Hildor disse:

    Jean-Pierre, acho que nem em cem anos haveria solução. O pobre bandoneon foi parar em boas mãos, depois de sofrer o diabo comigo. Não tenho jeito pra músico.
    Mas, de qualquer modo agradeço o apoio, e a participação aqui no blog.

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