Até quando os mitos?

Parte 1

Nos termos do atual artigo 108 do Código Civil vigente, a escritura pública é considerada essencial para a validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maio salário mínimo vigente no País.

Na prática, isso significa que, hoje, apenas as transações imobiliárias cujo valor seja superior a R$ 13.950,00 têm como requisito de validade a lavratura por escritura pública. Mesmo assim, é comum a realização de negócios jurídicos, com valor superior a esse, por meio de instrumento particular (inválidos, portanto).

A primeira observação que chama atenção é a de que muito provavelmente quem mais necessite, ou dizendo de outra forma, quem mais poderia tirar proveito da atuação notarial nestes negócios, de transferência, constituição, modificação de direitos reais, são as pessoas que negociam imóveis de valor inferior a 30 salários mínimos. Este é o consumidor que não raras vezes está impedido de contratar um advogado para redigir ou analisar e discutir as cláusulas do contrato. 

E porque a escritura pública ajudaria esse consumidor?

Porque o notário é um terceiro imparcial na negociação. Ele não defende o interesse de nenhum dos contratantes. Defende a legalidade do ato, a observância da legislação vigente e aplicável, neste caso, a observância da proteção que o legislador garante ao consumidor, parte hipossuficiente e vulnerável na contratação.

Não bastasse isso, a sua atividade envolve o aconselhamento e a mediação.

A formalização dos negócios jurídicos por meio de escritura pública garante a fiscalização, por exemplo, do artigo 51 do CDC, evitando a inserção de cláusulas nulas de pleno direito, dentre elas: a de cancelamento do contrato unilateralmente apenas pelo fornecedor; a que autoriza a modificação do conteúdo do contrato pelo fornecedor unilateralmente, após a sua celebração; as que permitem variação de preço de maneira unilateral; as que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas; as que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé e a eqüidade.

Tal fiscalização traz benefícios diretos ao consumidor, em um momento que por vezes é único na sua vida, o da aquisição de seu patrimônio, e consagra a atuação preventiva de litígios, que caracteriza a atividade notarial. 

Ou seja, mesmo nos casos em que a lei não exige, como requisito de validade para o ato, a lavratura da escritura pública se justifica, como mecanismo de controle da observância dos direitos do consumidor, e evitando futuros litígios. 

Lamentavelmente, ainda são muitos os mitos em relação à atividade notarial, que prejudicam seu bom desempenho e, em última análise, a própria sociedade. 

 

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  1. Flavio disse:

    Ótimo Karin. A questão é convencer as “autoridades”, porque é muito difícil fazer compreender isso. Seguimos nessa luta.

  2. Gilberto de Souza disse:

    Excelente artigo. A lavratura de uma ecritura é essencial.

    Ontem mesmo esteve em meu escritório um cliente que havia feito um contrato de compromisso de compra e venda de um imóvel cuja última parcela será em dezembro de 2010, tendo sido firmado em 2008.
    Expliquei para ele que seria ideal ele averbar o contrato na matrícula do imóvel para ele ter uma maior proteção. Ele me perguntou quanto sairia para fazer a averbação. Como eu não tinha idéia do preço ligeui para o CRI de Santa Maria, RS, e solicitei um arçamento, forneci o valor do contrato, que era o do imóvel, e queria uma resposta do tipo algo ntre “X” e “Y”. A resposta foi intrugante e difícil de aceitar: “- Não fizemso orçamento, o senhor tem que vir aqui para registrar os papéis, só então o senhor saberá o preço.”
    Fiquei pasmo, acho uma falat de respeito com o consumidor. Por mas que seja um serviçopúblico há uma relação de consumo e o CDC manda que o consumidor tem direito a receber informação adequada!
    Fico pensando nas pessoas que negociam uma compra e venda do imóvel e para ajustar melhor a forma de pagamento buscam informação sobre o valor global da transação, inclusive os respectivos registro, e na hora que vão se informar não conseguem saber os valores que serão gastos.
    Trata-se de uma media absurda que afasta as pessoas de fazer o respectivo registro, que diga-se de passagem não é um valor acessível, muito pelo contrário. Se no momento da transação ele não podem ter a medida dos gastos com a escrituração como eles vão ajustar o parcelamento do pagamento da compra do bem se sabem o tamanho do bolso de cada, principalmente do devedor, mas não sabem exatamente qunto tem que ter nele para efetuar os registros?
    Registrei uma reclamação semelhante ao Ministério da Justiça.
    Escrevo aqui porue verifiquei que é colégio dos notários e por isto talvez abra-se um debate sobre esta atitude, que eu considero equivocada.
    Se possíel, gostaria de saber o porque de não ser informado os preços das taxas por telefone?
    Blog: http://gilbertosouzaadvogado.blogspot.com/

  3. Marco Antonio disse:

    Dr. Eduardo.

    Esta questão do preço pelos serviços prestados é um pouco mais complexa do que pode parecer. Realmente não existe motivo para negar informação, por telefone, sobre o preço dos atos que serão praticados, mas, efetivamente o registrador somente poderá definir o preço correto com a análise pessoal do documento. É muito comum haver a necessidade de realização de prévia averbação (ato que, quase nunca é gratuito), antes da realização do registro.
    O grande problema é que o bolso do usuário é um órgão muito sensível à variações bruscas ou inesperadas de temperatura e pressão.
    Imagine a confusão armada: a pessoa liga para a cartório, fornece algumas informações e recebe uma estimativa de cálculo do preço final (muitos colegas fazem isso sem dificuldade alguma), o cidadão dirige-se ao cartório e, no momento efetivo do exame do título, nota-se que será necessário fazer duas averbações prévias e o custo será maior do que o informado; muitos entenderão perfeitamente a situação, mas outros irão se revoltar e estará armada a confusão.
    E difícil lidar com as pessoas. Por isso compreendo algum colega que se negue a “dar preço por telefone”. Entretanto, imagino, mesmo para estes casos, bastará uma conversa com o responsável pelo setor, explicar a necessidade de receber esta informação e lhe dar a garantia de que haverá compreensão sobre diferença que eventualmente ocorra quando o título for efetivamente apresentado, que tudo se resolverá com tranquilidade, pois onde existe bom-sendo, não há lugar para conflitos desnecessários.
    Aliás, as tabelas de custas são publicadas na imprensa oficial e tem fácil acesso pelo internet. Um cálculo aproximado dos total dos gastos pode ser feito sem maiores dificuldades por quem está acostumado com os detalhes da aplicação destas tabelas.

  4. Flavio Fischer disse:

    Verdade. É difícil adivinhar de que tipo de documento, conteúdo e eventuais averbações necessárias e prévias à realização do registro. Mas a resposta do ofício registral é inaceitável. Precisamos evoluir nas técnicas de gestão, na qualidade do atendimento, no tratamento com os clientes. Precisamos atender a todos, em qualquer tipo de ofício, mesmo o Registro de Imóveis (que não tem concorrência), no sentido de cativar, seduzir o usuário. Como se fôssemos perdê-lo, com nosso atendimento deficiente. Pensem nisso…

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